sexta-feira, março 14, 2014

Porque governo, juízes, promotores, psicólogos, têm interesse em alijar o psiquiatra da área criminal. Marcelo Caixeta. Medicina

PORQUE GOVERNO, JUÍZES, PROMOTORES, PSICÓLOGOS, TÊM INTERESSE EM ALIJAR O PSIQUIATRA DA ÁREA CRIMINAL ( uma análise baseada em "crimes famosos" cujas "causas psiquiátricas" são "escondidas" da população )

........................................................................................................

Um Promotor de Justiça do Rio Grande do Sul, José Taborda, que também é psiquiatra forense, fez uma pesquisa onde constatou que, nas prisões brasileiras, há uma média de 80% de portadores de doenças psiquiátricas.
Portanto, cadeia, no Brasil, virou lugar de doente mental, sendo que os verdadeiros criminosos, geralmente estão em outro lugar, talvez dentro das casas legislativas e palácios suntuosos do Governo.
No entanto, apesar disto, o médico psiquiatra é completamente excluído do sistema penitenciário, ao ponto de Goiás, por exemplo, contar com dezenas de milhares de presos e praticamente nenhum psiquiatra forense para dar-lhes assistência. Esta “exclusão governamental do psiquiatra” não é de se espantar : a primeira fala do novo ministro da saúde, Arthur Chioro, teria sido : “vamos continuar acabando com os hospitais psiquiátricos”.
No combate ao crack, por exemplo, fala-se de “programas e mais programas”, mas nunca se cita o óbvio, por exemplo, que se estes dependentes , hoje irrecuperáveis, tivessem tido atendimento psiquiátrico precoce, uma vez que aproximadamente 90% tiveram hiperatividade na infância ( além de outros transtornos ) , não teriam chegado ao estado calamitoso onde estão.
Enquanto isto, os verdadeiros “crimes”, que são os “crimes de gente normal”, estes continuam fora da cadeia. Até pelo contrário, seus perpetradores continuam frequentando os mais suntuosos palácios da República , dos Governos e das Empresas. Os verdadeiros crimes normais não são impulsivos, não são escancarados, descontrolados, explosivos, são aqueles planejados, arquitetados com genialidade, com “rotas de fuga” e evidências encobertas com precisão cirúrgica , com os rastros apagados a preço de ouro, inclusive ouro que irriga o próprio sistema jurídico-policial ( vide “mensalão”, p.ex. ) .
Enquanto o profissional mais carente no sistema, o psiquiatra, não existe, ou não é contratado por baixíssimos salários ( p.ex., querem pagar 3 mil reais para o cara arriscar a vida num presídio ), outros protagonistas do sistema, desta vez do sistema jurídico-advocatício-promotorias, são pagos praticamente a preço de ouro.
Quando algum crime “espetacular”, geralmente patológico, é cometido, a mídia apressa-se em colher opiniões de todos os segmentos da sociedade, psicólogos, policiais, sociólogos, delegados, juízes, promotores, religiosos, até um pai-de-santo já foi ouvido. Raramente escuta-se a figura do “abominável psiquiatra” : “isto não tem causa médica, isto é problema social, é problema de família, é problema psicológico”, etc. O tempo passa, todos se esquecem, e depois de muita investigação, quando se conclui que a causa era psiquiátrica ( geralmente decorrente de falta de assistência psiquiátrica do criminoso, que já denotava indícios de doença mental antes ), ninguém vem a público “desvendar o enigma”.
Assim aconteceu com o caso de Gustavo Pissardo, por exemplo, aquele rapaz que, em Campinas - SP, matou os avós, pegou um ônibus tranquilamente, foi até S.J. dos Campos e matou os pais. Todos o julgaram um “monstro”, “fez aquilo para pegar a herança”, os psicólogos apressaram-se a mostrar o “fruto moderno da frieza dos filhos”, “desrespeito aos pais”, “banalização da vida”, e outros blábláblás clichês e lugares-comuns. Ninguém vem a público depois desmascarar as causas psiquiátricas do crime : um meningioma de asa do esfenoide, um dos tipos de tumor cerebral que , comprimindo o sistema límbico ( área de processamento emocional ) , leva a graves alterações do comportamento criminal.
Assim também foi com o caso de Marcelo Peseghinni, aquele garoto que pegou a arma dos pais, dois policiais militares de SP, e dizimou uma parte da família, foi para escola, voltou e dizimou o resto, suicidando-se em seguida. Exames psiquiátricos também constataram lesão cerebral por causa de doença genética, congênita, fibrose cística, doença esta que, por causa de problemas pulmonares, p.ex., pneumotórax espontâneo, levou à hipóxia cerebral, produzindo lesões encefálicas que levaram à delírios de morte, perseguição, grandiosidade, megalomania, concretismo, belicosidade, confusão da fantasia ( “estou como em um videogame”) com realidade . Estes traços patológicos, prá variar, nunca foram corretamente levados à médico psiquiatra, diagnosticados e tratados, o que poderia ter evitado a tragédia.
Convencionou-se, no Brasil, adotar-se uma política, largamente apregoada por movimentos de psicólogos, de “des-medicalização”, entre outras pérolas dizendo que “hiperatividade não existe”, é super-diagnosticada e sobre-tratada, “dopando-se” as crianças. São movimentos muito bem orquestrados, unidos por interesses comuns, ora com finalidade política ( contratar-se mais profissionais não-psiquiatras na rede pública, esmagar uma classe - a médica - que ainda tem algum poder de penetração e independência do Estado na Sociedade Civil ), ora com finalidade corporativa ( “ganhar no tapetão”, negando-se a doença psiquiátrica, estrategicamente, para influir escolhas do tipo : “este problema do meu filho eu vou levar é pro psicólogo, Deus me livre de levar isto para um “médico de doidos”, que vai fazer é dopá-lo”).
O resultado do descalabro está aí. Só não digo “está aí prá todo mundo ver” porque, como se viu, até os resultados são encobertos, justamente prá ninguém ver.
..........................................................................................................................
Marcelo Caixeta, psiquiatra . ( escreve às terças, sextas, domingos) - dm.com.br - seção Opinião Pública ( hospitalasmigo@gmail.com).

Nenhum comentário:

Postar um comentário