terça-feira, agosto 16, 2022

Ética a Nicômaco. 4. Aristóteles

 

4 Retomemos a nossa investigação e procuremos determinar, à luz deste fato de que todo conhecimento e todo trabalho visa a algum bem, quais afirmamos ser os objetivos da ciência política e qual é o mais alto de todos os bens que se podem alcançar pela ação. Verbalmente, quase todos estão de acordo, pois tanto o vulgo como os homens de cultura superior dizem ser esse fim a felicidade e identificam o bem viver e o bem agir como o ser feliz. Diferem, porém, quanto ao que seja a felicidade, e o vulgo não o concebe do mesmo modo que os sábios. Os primeiros pensam que seja alguma coisa simples e óbvia, como o prazer, a riqueza ou as honras, muito embora discordem entre si; e não raro o mesmo homem a identifica com diferentes coisas, com a saúde quando está doente, e com a riqueza quando é pobre. Cônscios da sua própria ignorância, não obstante, admiram aqueles que proclamam algum grande ideal inacessível à sua compreensão. Ora, alguns têm pensado que, à parte esses numerosos bens, existe outro que ê auto subsistente e também é causa da bondade de todos os demais. Seria talvez infrutífero examinar todas as opiniões que têm sido sustentadas a esse respeito; basta considerar as mais difundidas ou aquelas que parecem ser defensáveis. Não percamos de vista, porém, que há uma diferença entre os argumentos que procedem dos primeiros princípios e os que se voltam para eles. O próprio Platão havia levantado esta questão, perguntando, como costumava fazer: "Nosso caminho parte dos primeiros princípios ou se dirige para eles?" Há aí uma diferença, como há, num estádio, entre a reta que vai dos juízes ao ponto de retorno e o caminho de volta. Com efeito, embora devamos começar pelo que é conhecido, os objetos de conhecimento o são em dois sentidos diferentes: alguns para nós, outros na acepção absoluta da palavra. É de presumir, pois, que devamos começar pelas coisas que nos são conhecidas, a nós. Eis aí por que, a fim de ouvir inteligentemente as preleções sobre o que é nobre e justo, e em geral sobre temas de ciência política, é preciso ter sido educado nos bons hábitos. Porquanto o fato é o ponto de partida, e se for suficientemente claro para o ouvinte, não haverá necessidade de explicar por que é assim; e o homem que foi bem educado já possui esses pontos de partida ou pode adquiri-los com facilidade. Quanto àquele que nem os possui, nem é capaz de adquiri-los, que ouça as palavras de Hesíodo: Ótimo é aquele que de si mesmo conhece todas as coisas; Bom, o que escuta os conselhos dos homens judiciosos. Mas o que por si não pensa, nem acolhe a sabedoria alheia, Esse é, em verdade, uma criatura inútil.

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