POR QUE NÃO SOU CIRURGIÃO
Charles Fonseca
Quinto ano de medicina. Vagueava absorto nos corredores do Hospital das Clínicas da Universidade Federal da Bahia. Num dia, de cara amarrada, perguntei a um passante onde ficava determinado lugar. Prontamente me ensinou e, com visão clínica, me perguntou se estava precisando de alguma coisa. Era o Dr. Álvaro Rabello. Lhe disse que estava me sentindo perdido naquela hospital sem uma orientação da estrutura e o que ele me poderia oferecer.
- Venha visitar a nossa Clínica Propedêutica Cirúrgica. Todos os dias fazemos visita clínica às enfermarias, supervisionando e ensinando aos internos e médicos residentes. Detonou a bolha. Passei a frequentá-la, trabalhei como estagiário em pesquisa clínica e me capacitei já no sexto ano a ser considerado o melhor interno candidato à vaga de Médico Residente em Cirurgia: "grande capacidade para o trabalho, invulgar senso de responsabilidade, inteligência e seriedade de propósitos" dizia a carta de recomendação do Professor Dr. Jones Seabra, titular da Cátedra.
Mas a vida é real e tem viés. Pai desempregado fazendo bico numa banca de jornal. Mãe funcionária dos Correios. E cinco irmãos. Eu era o mais velho. Caí no mercado de trabalho e durante sete anos, direta ou indiretamente provi a casa com 70% dos meus rendimentos. Aos 31 anos mudei de estado civil. Só não obteve conclusão de curso universitário quem não quis ou não pôde.
Nenhum comentário:
Postar um comentário