quinta-feira, agosto 26, 2021

[TODAS AS MANHÃS]. Decio Bar. 243

 

Decio Bar

 



[TODAS AS MANHÃS]


Todas as manhãs —
            mesmo as cavalgadas por astros
            esporeados, as adormecidas em
            noturnos abraços de serpentina,
            as que vêm de naufrágios em
            taças de magnésio, as que surgem
            repentinas (aquelas em que
            percebemos o crescimento da sombra
            das unhas) —
Todas as manhãs
            uma tempestade sai do mar e eu
            sou o seu oco:

            ... — e não, ainda não se dá o tempo
            da clarineta, e nem a tesoura recortando
            os calendários de sangue entrevê
            a água de espelhos, e assim
Todas as manhãs
            com o sol dentro do copo, sondo os
            cabos submarinos em busca de avarias,
            indago de algum telegrafista desertor
            roído de nostalgia, e vasculhando os
            céus I’m just a man in a crowd — poor
            cloud of birds and angels; e assim vou
            — na trilha, nos trilhos — de uma parede
            ao muro que me limita, com os olhos
            muito longe de mim 

E neste ritual
            em que não faltam túmulos de jornais,
            flautas enlanguescidas por carência de valsa
            compulsando corpos que o inverno
            reduziu da medida de meus delírios; aliando-me a
            querubins alucinados sedentos
            de ambigüidades; valendo-me de um
            telefone de aço para uso psicotrópico;
            deitando cartas no leito das formas
            que se pode adivinhar no bojo das
            nuvens, ou na epiderme da pólvora

Neste ritual espero
                     da outra manhã
       que me sirva à mesa no meu banquete
                     de rebeldia

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