Olavo de Carvalho
2a parte
Na primeira parte da aula, dei uma idéia geral sobre Aristóteles e sobre nossos motivos para estudá-lo. Agora vou expor o método a ser usado neste curso. Mas antes devo responder à pergunta que um aluno me fez no intervalo, a respeito da natureza matemática dos arquétipos platônicos, questão que é importante para o que estudaremos mais tarde, porque veremos que uma das principais modificações introduzidas por Aristóteles foi justamente a de desgeometrizar, ou desmatematizar, a teoria do conceito, fazendo do pensamento lógico menos uma estrutura formalmente pura do que um método para o conhecimento da realidade efetiva. A explicação da natureza matemática do "mundo das Idéias" encontra-se sobretudo no Timeu, um dos livros mais difíceis e mais interessantes de Platão. O ensinamento de Platão se dividia em duas partes, escrita e oral. O escrito era usado como instrumento de divulgação, sendo o melhor de sua filosofiia reservado para o ensinamento oral. Durante quase dois mil anos, este ensino oral constituiu um dos maiores enigmas da história da filosofia e só muito recentemente, com os progressos da documentação, é que foi possível esboçar uma reconstituição do que teria sido o ensinamento oral de Platão. Reconstituição feita a partir dos testemunhos e depoimentos deixados, e mediante comparação desses materiais com os textos de Platão. Como tudo isto ficou disperso ao longo da história, não havia muitos meios de reunir esse material. No século XX, quando o sistema internacional de documentação chegou a uma perfeição quase luxuosa, foi possível fazer esta reconstituição, empreendida sobretudo por um grande historiador da filosofia italiano chamado Giovanni Reale. Por uma coincidência, um filósofo brasileiro chamado Mário Ferreira dos Santos havia tentado a mesma reconstituição, não por meios histórico-filológicos como Reale, mas sim por meios puramente filosóficos e especulativos, e seus resultados foram singularmente idênticos aos de Reale, só que apresentados quinze anos antes! Mário Ferreira é o único grande filósofo que este país produziu, para o meu gosto o maior dos brasileiros, mas infelizmente o nosso meio universitário continua a ignorá-lo, por um misto de ignorância presunçosa e despeito. Tanto os resultados de Mário Ferreira como os de Reale permitem colocar Platão, com bastante segurança, como herdeiro da escola pitagórica. Em suma, a famosa doutrina das idéias somente se esclarece se entendermos que, para além do mundo das idéias, Platão admitia uma terceira instância, que seria o mundo dos princípios ou leis — o mundo dos modelos matemáticos que estruturam a realidade. Neste caso teríamos não dois, mas três planos: primeiro, o da realidade sensível; segundo, o mundo das idéias, e, terceiro, o mundo das leis ou princípios ( relações matemáticas, basicamente, mas no sentido não-quantitativo das matemáticas, isto é, como lógica pura ). Esta interpretação de Platão é bastante recente na historiografia. Existe em português uma resenha do livro de Giovanni Reale feita pelo Pe. Henrique Lima Vaz na revista Síntese, de Belo Horizonte. Os estudos filológicos a respeito de Platão e Aristóteles evoluíram muito no século XX. Os estudiosos recentes que deram contribuições substantivas são em grande número. Mas isto nos leva de volta à questão do método.
(continua)
sexta-feira, agosto 23, 2019
Pensamento e atualidade de Aristóteles. Olavo de Carvalho.
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