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sábado, novembro 18, 2017

A meditação sobre o Tietê. Mário de Andrade. Poesia

A MEDITAÇÃO SOBRE O TIETÊ
Mário de Andrade
(trecho inicial)

Água do meu Tietê,
Onde me queres levar?
— Rio que entras pela terra
E que me afastas do mar...

É noite. E tudo é noite. Debaixo do arco
[ admirável
Da Ponte das Bandeiras o rio
Murmura num banzeiro de água pesada e oleosa.
É noite e tudo é noite. Uma ronda de sombras,
Soturnas sombras, enchem de noite tão vasta
O peito do rio, que é como se a noite fosse
[ água,
Água noturna, noite líquida, afogando de
[ apreensões
As altas torres do meu coração exausto. De
[ repente
O óleo das águas recolhe em cheio luzes
[ trêmulas,
É um susto. E num momento o rio
Esplende em luzes inumeráveis, lares, palácios
[ e ruas,
Ruas, ruas, por onde os dinossauros caxingam
Agora, arranha-céus valentes donde saltam
Os bichos blau e os punidores gatos verdes,
Em cânticos, em prazeres, em trabalhos e
[ fábricas,
Luzes e glória. É a cidade... É a emaranhada
[ forma
Humana corrupta da vida que muge e se aplaude.
E se aclama e se falsifica e se esconde. E
[ deslumbra.
Mas é um momento só. Logo o rio escurece de
[ novo,
Está negro. As águas oleosas e pesadas se
[ aplacam
Num gemido. Flor. Tristeza que timbra um
[ caminho de morte.
É noite. E tudo é noite. E o meu coração
[ devastado
É um rumor de germes insalubres pela noite
[ insone e humana.

De Lira Paulistana
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