— Que história é essa de gato “fazendo sonetos à Lua?” – interpelou a menina. A senhora está
ficando muito “literária”, vovó...
Dona Benta riu-se.
— Sim, minha filha. Apesar do meu desamor pela “literatura”, às vezes faço alguma. Isso aí é
uma “imagem literária”. A Lua é um astro poético, e quando um gatinho anda miando pelo
telhado, um poeta pode dizer que ele está fazendo sonetos à Lua. É uma bobagenzinha poética.
— “Desamor pela literatura”, vovó? Estranhou Pedrinho. Então a senhora desama a literatura?
Dona Benta suspirou.
— Meu filho, há duas espécies de literatura, uma entre aspas e outra sem aspas. Eu gosto desta
e detesto aquela. A literatura sem aspas é a dos grandes livros; e a com aspas é a dos livros que
não valem nada. Se eu digo: “Estava uma linda manhã de céu azul”, estou fazendo literatura sem
aspas, da boa. Mas se eu digo: “Estava uma gloriosa manhã de céu americanamente azul”, eu
faço “literatura” da espada – da que merece pau.
— Compreendo, vovó – disse a menina – e sei dum exemplo ainda melhor. No dia dos anos da
Candoca o jornal da vila trouxe uma notícia assim: “Colhe hoje mais uma violeta no jardim da
sua preciosa existência a gentil Senhorita Candoca de Moura, ebúrneo ornamento da sociedade
itaoquense”. Isto me parece literatura com dez aspas.
— E é, minha filha. É da que pede pau... 1882
sábado, maio 09, 2015
Fábula. Monteiro Lobato.
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