terça-feira, janeiro 17, 2012

Casa 11
Lívia Vieira

Enquanto era criança habitei uma rua. Na rua havia uma ladeira. Ali, bem no meio da ladeira, quando se descia, avistava-se de pronto uma casa. A casa de número 11. Era cor-de-rosa, brilhava e cheirava. E conversava comigo. Era a minha casa. Lá moravam meus medos, amores e fantasias. Às vezes o medo era tão grande... medo de morrer, medo de viver, medo do não viver... que até dava vontade de não chorar e enfrentá-los. Quando acordava, nunca estava só. Olhava ao meu redor e sabia que tinha uma família. Um pai, uma mãe e tantos irmãos. Na maioria das vezes não foi fácil nem leve conviver assim com tantos irmãos. Muitas direções, escolhas as mais diversas, pensamentos conflitantes, extrema rigidez do pai, doce dubiedade da mãe... “Socorro!” – era o que gritava no meu silêncio.
Será que sou amado(a)? Era a pergunta estampada na alma de cada um de nós. Para lê-la, entretanto, tive que aprender alguns truques. Revirar as palavras pelo avesso foi o principal deles. Exercitando a brincadeira de dizer nossos nomes ao contrário, pude aprender sozinha que o mundo também se lê de trás pra frente. E assim cresci. Atentando para possíveis perguntas que pudessem ser lidas por entre aquilo que se diz, sem saber que se diz.
Na casa número 11 havia muita gente. Gente gorda, gente magra. Gente loira, gente morena. Gente confusa, gente nem tanto. Barulho, silêncio, presença, ausência, aconchego, desafeto. Ainda bem...

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