segunda-feira, agosto 08, 2011

Nunca perca o equilíbrio




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RAIZ AMARGA
Henriqueta Lisboa


Sinto que sou raiz amarga.
Terra gretada é minha sede.
Núcleo de sombras é meu cárcere.

Lá fora - ao sol, à chuva,
ao frio -rastejarei à flor do chão?
Estarei no ar em clorofila?...

Não sei se há a graça do tronco,
pássaros abrigados nas franças,
escaravelhos zumbindo nos brotos.

Não sei se há doçura de pétalas,
nem aconchego de folhagem
dormindo sobre espelhos d'água.

Seja de ouro o pólen ao vento,

de ouro o mel a escorrer do cerne,
de ouro a flama em torno da lenha!

Sonho a paisagem do meu quadro:
vale seivoso entre montanhase
o céu - acima de minha fronde.

Porém meus gestos precingidos
como os nós cegos das amarras
furtam-me a toda revelação.

Talvez - condenada ao deserto -
eu realize apenas miragem
na imaginação dos homens.



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Freud e a domadora
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CNJ traça mapa da corrupção na Justiça

BRASÍLIA - O Judiciário convive com casos de desvios de verbas, vendas de sentenças, contratos irregulares, nepotismo e criação de entidades vinculadas aos próprios juízes para administrar verbas de tribunais. Esse retrato de um Poder que ainda padece de casos de corrupção e de irregularidades foi identificado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a partir de inspeções realizadas pela sua Corregedoria em quase todos os Estados brasileiros.

"Há muitos problemas no Judiciário e eles são de todos os tipos e de todos os gêneros", afirmou ao Valor a ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça. Para ela, diante de tantas irregularidades na Justiça é difícil identificar qual é o Estado com problemas mais graves. Há centenas de casos envolvendo supostos desvios de juízes, entre eles, venda de sentenças, grilagem de terras e suspeita de favorecimento na liberação de precatórios. Além disso, o Conselho identificou dezenas de contratos irregulares em vários tribunais do país.

No Espírito Santo, a contratação de serviços pelo Judiciário chegou ao cúmulo quando o TJ adquiriu os serviços de degustação de café. O CNJ mandou cancelar o contrato de "análise sensorial" da bebida, que vigorou até junho de 2009. O Conselho também descobriu casos de nepotismo e de servidores exonerados do TJ que recebiam 13º salário.

Em Pernambuco e na Paraíba, associações de mulheres de magistrados exploraram diversos serviços, como estacionamento e xerox, dentro do prédio do TJ. Na Paraíba, o pagamento de jeton beneficiou não apenas os juízes mas a Junta Médica do tribunal.

Pernambuco ainda teve casos de excessos de funcionários contratados sem concurso público nos gabinetes. O CNJ contou 384 funcionários comissionados no TJ, a maioria nos gabinetes dos desembargadores, onde são tomadas as decisões.

No Ceará, a Justiça local contratou advogados para trabalhar no TJ. É como ter agentes interessados em casos de seus clientes diretamente vinculados a quem vai julgá-los. Ao todo, 21 profissionais liberais trabalharam no TJ de Fortaleza e custaram R$ 370 mil aos cofres do Estado.

No Pará, o CNJ determinou o fim de um contrato com empresa de bufê que chegou a fazer 40 serviços por ano para o TJ - em ocasiões como posses, inaugurações, confraternização natalina e na tradicional visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Nazaré. Além disso, o Conselho identificou sorteios direcionados de juízes para decidir casos. Num desses sorteios, participou um único desembargador.

Decisões que levam à liberação de altas quantias de dinheiro também estão sob investigação do CNJ. No Maranhão, sete juízes de São Luís foram afastados após o Conselho verificar que eles estavam liberando altas somas em dinheiro através da concessão de liminares em ações de indenização por dano moral. Uma delas permitia a penhora on-line de R$ 1,9 milhão e sua retirada, se necessário, com apoio de força policial.

No Mato Grosso, dez juízes foram aposentados compulsoriamente pelo CNJ, após acusação de desvio de R$ 1,5 milhão do TJ para cobrir prejuízos de uma loja maçônica.

Um sistema de empréstimos contraídos por magistrados do Distrito Federal levou o CNJ a abrir investigação contra a Associação dos Juízes Federais da 1ª Região (Ajufer). De acordo com as denúncias, um magistrado da Ajufer usava o nome de outros juízes para fazer empréstimos bancários para a entidade. Sem saber, muitos juízes se endividaram em centenas de milhares de reais. Os conselheiros Walter Nunes e Felipe Locke Cavalcanti identificaram que o esquema da Ajufer era, em tese, criminoso, pois indica a prática de fraude e de estelionato.

Mas o caso da Ajufer está longe de ser o mais conhecido esquema de administração de verbas por magistrados. Entre as entidades ligadas a juízes que gerenciaram recursos e serviços no Judiciário, a mais famosa foi o Instituto Pedro Ribeiro de Administração Judiciária (Ipraj), que funcionou por mais de 20 anos na Bahia e foi fechado pelo CNJ. O Ipraj cuidou da arrecadação de recursos para o Judiciário baiano e administrou tanto dinheiro que chegou a repassar R$ 30 milhões para a Secretaria da Fazenda da Bahia.

Casos de favorecimento na liberação de verbas de precatórios também chamam a atenção. Ao inspecionar o TJ do Piauí, o CNJ concluiu que não havia critério para autorizar o pagamento desses títulos para determinados credores. No TJ do Amazonas, foram identificados "indícios veementes da total falta de controle sobre as inscrições e a ordem de satisfação dos precatórios."

Situação semelhante foi verificada no Tocantins. A ex-presidente do TJ Willamara Leila e dois desembargadores foram afastados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), após operação da Polícia Federal que identificou um suposto esquema de venda de sentenças e de favorecimento no pagamento de precatórios. O TJ tocantinense também padece de investigação de empréstimos consignados em excesso para desembargadores. Um magistrado chegou a ter 97% de sua remuneração comprometida.

Em Alagoas, a equipe do CNJ identificou dezenas de problemas na administração da Justiça local. "Verificamos situações inadmissíveis, como a de um magistrado que, em 2008, recebeu 76 diárias acumuladas, de diferentes exercícios", diz o relatório feito pelo Conselho. Outro caso considerado grave envolveu o pagamento em duplicidade para um funcionário que ganhava como contratado por empresa terceirizada para prestar serviços para o mesmo tribunal em que atua como servidor.

A troca de favores entre os governos dos Estados, as assembleias legislativas e os TJs é outro problema grave. Depois que o CNJ mandou cancelar o jeton na Paraíba, a Assembleia Legislativa aprovou uma lei para torná-lo válido. Há uma troca constante de funcionários entre os três Poderes na Paraíba. Ao todo, 34,3% da força de trabalho da Justiça vem do Executivo Estadual e Municipal, fato que, para o CNJ, "se configura como desvio da obrigatoriedade de realização de concurso público".

Essa situação chegou ao extremo no Amazonas, onde um juiz de Parintins reclamou que não tinha independência para julgar porque praticamente todos os servidores eram cedidos pelo município. "Quando profere uma decisão contra o município o prefeito retira os funcionários", diz o relatório do CNJ.

Das 3,5 mil investigações em curso no CNJ, pelo menos 630 envolvem magistrados. Entre abril de 2008 até dezembro de 2010, o Conselho condenou juízes em 45 oportunidades. Em 21 deles, foi aplicada a pena máxima: o juiz é aposentado, mas recebe salário integral. Simplesmente, para de trabalhar.

(Juliano Basile e Maíra Magro | Valor)







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MODESTA CONTRIBUIÇÃO SOBRE O FOGO DA PEDREIRA
VINGANÇA DE CANGACEIRO

Antônio Adriano de Medeiros



[Antonio Silvino e seu Bando]

Minha boa mãe, com seus 89 anos, não gostaria de saber que estou contando isso; malgrado tais fatos tenham ocorrido por volta de 1901, ela ainda teme por vingança ou prisão: conhece o sertão dos diabos. Também Ivan Lessa, jornalista auto-exilado em Londres desde a Década de 60, decerto me desaconselharia, pois, segundo ele, é perigoso contar certos fatos envolvendo poderosos no Brasil: "Aí tudo termina em tiro ou Processo", escreveu ele recentemente.

Mas a verdade é que havia meu bisavô materno no meio do caminho. João Freire de Araújo estava no roçado trabalhando com seu filho Miguel, entre Santa Luzia e Caicó, na fronteira da Paraíba com o Rio Grande do Norte, quando de repente se viu cercado pelo bando do cangaceiro Antônio Silvino. Queriam saber o caminho para a Fazenda Pedreira e o intimariam a ir levá-los até as proximidades das terras de Janúncio Nóbrega, pois eram convidados para o casamento de sua filha. Porém nada disseram de seu destino e planos na presença do menino:

- Primeiro vá deixar esse menino em casa: tem coisas que não se conversa na frente de menino!

Só quando voltou João Freire de Araújo ficou sabendo que iria levá-los até a Pedreira

- E ai do senhor se negar a servir a Antônio Silvino e sua tropa justiceira! Ou se me enganar ou trair, indo fazer cabuetagem nos ouvidos dos macacos!

- Quéisso, Coroné Antôin Silvino: é uma satisfação pra eu poder servir a um homem grande como o senhor! Não só ensino o camin da fazenda do Coroné Janúncio, como convido os senhores pra almoçar lá em casa... Guiné e galinha não faltam, e a mulher com as meninas sabem preparar muito bem. E ainda tem feijão macaça e o arroz da terra, e um jerimum que é uma delícia... Quer dizer, é comida simples, de sertanejo remediado...

Quem tem vários bois esperando não perde tempo com galinhas, nem era costume de Antônio Silvino almoçar em casa de desconhecidos, ainda mais quando estava indo ficar com uns alguns muito bem hospedado dias numa grande fazenda a poucos quilômetros dali.

Decerto que no caminho João Freire de Araújo lembrou-se do que lhe contaram sobre as frequentes visitas do cangaceiro à casa de seu parente mais abastado, o Véi Amaro do Poção. Eu não sei o que é que tem beradeiro, a quintessência do matuto, o matuto que é matuto até para o matuto, pra achar que só porque está conversando com alguém importante, já é amigo íntimo dele, e se mete a querer dar conselhos e fazer perguntas inconvenientes. Pois consta que um irmão de meu avô paterno, que minha mãe chama de Ti Zezim, empolgado ali com a conversa com os cangaceiros, certo dia saiu-se com essa na casa do Véi Amaro do Poção, parente nosso:

- Mas menino, me diga uma coisa: os senhores são pessoas tão boas, tão agradáveis... Pra quê querem essas armas? Vocês não precisam disso...

De repente se fez silêncio no recinto, cortado apenas pelo riso sem graça do berradeiro, aquele riso meio histérico tentando ser agradável de quem nota que falou besteira e não tem mais como remediar: "Rêrrêrrêrrê, rêrrêrrêrrê..."

Eis que Pilão Deitado levantou-se e dirigiu-se até o berradeiro, Ti Zezim. Ao chegar na sua frente, puxou o punhal e disse:

- A gente quer essas coisinhas porque quando encontra uma pessoa que a gente não gosta, a gente faz assim, faz assim, faz assim, faz assim e faz assim.

A cada "faz assim" de Pilão Deitado, ora de pé, ele esfregava o punhal na pele do berradeiro; primeiro no pescoço, dos dois lados, depois no abdome, dos lados, na frente e atrás, e parece que em seguida desceu pro ente pernas.

De forma que meu bisavô, que era um sábio, falava apenas quando instado a isso enquanto caminhava ao lado de Antônio Silvino e seu bando de cangaceiros. Afinal, surgiu a casa da Pedreira, e João quis voltar. O cangaceiro deu permissão, mas com uma condição quase bíblica: que ele não olhasse para trás, do contrário receberia chumbo.

A festa, dizem, foi grande. Por lá permaneceram os cangaceiros três dias, e certamente mais tempo teriam ficado se não tivesse acontecido aquilo... O Fogo!

Pilão Deitado estava fora da casa, trocando idéias com moradores e encantado com algumas nóbregas de pele morena, quando começou o tiroteio. Foi uma Patrulha Volante da Paraíba que chegou sorrateiramente, e suspeita-se de que a informação exata de onde estavam Antônio Silvino e seu bando partiu de gente de Santa Luzia. Um tio-avô meu, Antônio Tomaz, de saudosa memória, contava que o bando, ao pernoitar nos arredores da Umburana, assustou e maltratou Caetano Marinho, o qual saiu correndo desesperado, e que um cangaceiro ainda apontou o rifle pra meter bala nele, mas que Antônio Silvino não permitiu o disparo:

- Ele correu, quer viver, deixe viver...

Bom, o fato é que a volante, como era chamada a patrulha volante da Polícia, atacou de surpresa. Era bala zuando, bala indo e bala vindo, bala pra lá e bala pra cá. Logo o famoso Pilão Deitado estava estatelado no chão, coberto de sangue, como outros cangaceiros menos importantes. E a bala zoava em busca de Antônio Silvino e voltava das janelas da casa, tanto do térreo como do primeiro andar, enquanto tinha cangaceiro dentro de casa.

E haja bala, meu Deus, e haja fogo! Vivo, nenhum cangaceiro ficaria na fazenda, era decisão do comando da volante, que, quando tudo acabou, vistoriou toda a Fazenda.

Antônio Silvino escapou, como também o grosso do bando, sabe-se lá por onde, nem para onde. Consta - ainda segundo me contava Ti Totonho, como chamávamos Antônio Tomaz - que dois soldados ainda perseguiram o chefe dos cangaceiros, mas que Silvino matou os dois com um tiro só: vinham muito juntos um atrás do outro, afoitos pra pegar o famoso cangaceiro... Antônio Silvino era um herói para muita gente da região, e ainda hoje sua memória e respeitada naquele sertão. Conheço famílias bastante respeitadas - e respeitáveis - de Caicó que trazem no nome de filhos uma homenagem ao cangaceiro, sendo que o nome "Silvino" é sinônimo de bravura. Após ser preso vários anos depois, tirou uns anos de cadeia em Campina Grande, mas morreu de causas naturais, já bem idoso, e em liberdade.

Aconteceu também de dois jovens cangaceiros se perderem na fuga e irem dar na cidade de Santa Luzia. Capturados imediatamente pelas forças da Lei, o Coronel Aristides Guerra, todo-poderoso de então, misto de prefeito, juiz e delegado, deu a seguinte ordem:

- É pra matar de fome e sede na cadeia!

Muita gente ia olhar os enjaulados, e os via implorando por água e comida, mas nada se podia fazer. Eis, porém que a única pessoa que poderia se contrapor ao Coronel Aristides Guerra, a sua esposa, apiedou-se dos condenados e disse que de sede eles não morriam dentro de Santa Luzia, levando uma quartinha de água para os prisioneiros, a qual deveria ficar sempre cheia. Por isso o Coronel Aristides mudou seu plano de execução, e mandou abater os cangaceiros à bala nos arredores da cidade.

Contam que um deles chorava e implorava clemência aos algozes, mas que o outro, na hora derradeira, gritou, apontando o próprio peito:

- Atire aqui! Atire que eu quero ver o buraco da bala e lamber o sangue!

E foram executados.

Dez anos depois já ninguém falava mais dos executados, tudo estaria aparentemente esquecido. Mas um homem se lembrava, e não era qualquer um: Antônio Silvino, o Lampião da Paraíba. Chegou com seu bando de repente na cidade, recolheram as armas da polícia, e logo rumaram para a casa do Coronel Aristides. As lojas da família foram saqueadas e todas as mercadorias atiradas no meio da rua. Os rolos de tecidos, eles seguravam na ponta e o jogavam para o ar, como se fosse tapetes de boas vindas.

- Toma, pobreza!

Evidentemente que alguns populares se aproveitaram e pegaram as mercadorias. Nem todas as famílias se aproveitaram do saque, mas sei de algumas que o fizeram. Minha mãe me contou que uma vizinha sua lhe disse vários anos depois que "Fulano de Tal enricou" nesse dia, carregando mercadorias para casa.

Também os instrumentos da Filarmônica Municipal, cujos dirigentes eram de família ligada a Aristides Guerra, caíram nas mãos dos cangaceiros, que fizeram festa nas ruas com eles. O maestro Ezequiel Fernandes, que como todo artista tinha amor aos instrumentos de sua arte, estava num bairro afastado da cidade, o chamado Outro Lado do Rio, e, já sabendo que o bando invadira a cidade, ao ouvir o som de seus instrumentos teve um ataque cardíaco e morreu na hora.

A casa do Coronel Aristides Guerra ficava na praça em frente à igreja matriz. Ao chegarem lá para a vingança, uma e sua filhas protestou, Aristana. Contam que Antônio Silvio a segurou pelos cabelos puxou, e disse:

- Fique quieta, viu neguinha!

Alguns historiadores ligados à família do Coronel Aristides negam estes fatos, mas ouvi-os de pessoas confiáveis, de várias outras famílias de Santa Luzia, e todos confirmam a história.

O que o Antônio Sivino queria era humilhar Aristides Guerra e deixá-lo vivo para que sobrevivesse à humilhação. Acredito também que o velho cangaceiro era inteligente a ponto de saber que se matasse um homem poderoso e ligado ao poder instituído, também seria morto caso um dia fosse preso pelas forças da Lei.

Assim sendo, ele apenas deu uma grande surra no Coronel Aristides Guerra, obrigou-o a ficar de quatro, montou sobre ele como as crianças fazem brincando de cavalinho, e o obrigou a dar algumas voltas em torno da praça que fica defronte à Matriz de Santa Luzia. Isso tudo acompanhado pelo som dos instrumentos da Filarmônica Municipal, e pelos gritos dos cangaceiros.

E assim, dez anos depois, escreveu-se em Santa Luzia o último capítulo do chamado Fogo da Pedreira, fazenda que fica no município de Caicó. 

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