Pesquisar este blog

quinta-feira, maio 13, 2010

MEDICINA

Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade
(continuação)

Critérios diagnósticos

O diagnóstico do TDAH é fundamentalmente clínico, baseado em critérios operacionais claros e bem definidos, provenientes de sistemas classificatórios como o DSM-IV (vide quadro clínico) ou a CID-10. Em pesquisa no nosso meio, Rohde et al* encontram indicativos da adequação dos critérios propostos pelo DSM-IV, reforçando a aplicabilidade dos mesmos na nossa cultura.
O DSM-IV propõe a necessidade de pelo menos seis sintomas de desatenção e/ou seis sintomas de hiperatividade/impulsividade para o diagnóstico de TDAH. Entretanto, tem-se sugerido que esse limiar possa ser rebaixado para, talvez, cinco ou menos sintomas em adolescentes e adultos,7 visto que estes podem continuar com um grau significativo de prejuízo no seu funcionamento global, mesmo com menos de seis sintomas de desatenção e/ou de hiperatividade/impulsividade. Apesar de dados recentes no nosso meio não apoiarem esta sugestão,8 é importante não se restringir tanto ao número de sintomas no diagnóstico de adolescentes, mas sim ao grau de prejuízo dos mesmos. O nível de prejuízo deve ser sempre avaliado a partir das potencialidades do adolescente e do grau de esforço necessário para a manutenção do ajustamento.
O DSM-IV e a CID-10 incluem um critério de idade de início dos sintomas causando prejuízo (antes dos 7 anos) para o diagnóstico do transtorno. Entretanto, este critério é derivado apenas de opinião de comitê de experts no TDAH, sem qualquer evidência científica que sustente sua validade clínica. Recentemente, Rohde et al (2000)** demonstraram que o padrão sintomatológico e de comorbidade com outros transtornos disruptivos do comportamento, bem como o prejuízo funcional, não é significativamente diferente entre adolescentes com o transtorno que apresentam idade de início dos sintomas causando prejuízo antes e depois dos 7 anos. Ambos os grupos diferem do grupo de adolescentes sem o transtorno em todos os parâmetros mencionados. Sugere-se que o clínico não descarte a possibilidade do diagnóstico em pacientes que apresentem sintomas causando prejuízo apenas após os 7 anos.
Tipos de TDAH
O DSM-IV subdivide o TDAH em três tipos: a) TDAH com predomínio de sintomas de desatenção; b) TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade; c) TDAH combinado.3 O tipo com predomínio de sintomas de desatenção é mais freqüente no sexo feminino e parece apresentar, conjuntamente com o tipo combinado, uma taxa mais elevada de prejuízo acadêmico. As crianças com TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade, por outro lado, são mais agressivas e impulsivas do que as crianças com os outros dois tipos, e tendem a apresentar altas taxas de rejeição pelos colegas e de impopularidade. Embora sintomas de conduta, de oposição e de desafio ocorram mais freqüentemente em crianças com qualquer um dos tipos de TDAH do que em crianças normais, o tipo combinado está mais fortemente associado a esses comportamentos. Além disso, o tipo combinado apresenta também um maior prejuízo no funcionamento global, quando comparado aos dois outros grupos.
Comorbidade
As pesquisas mostram uma alta taxa de comorbidade entre o TDAH e os transtornos disruptivos do comportamento (transtorno de conduta e transtorno opositor desafiante), situada em torno de 30% a 50%.5 No nosso meio, Rohde et al. (1999)9 encontraram uma taxa de comorbidade de 47,8% com transtornos disruptivos em adolescentes com diagnóstico de TDAH. A taxa de comorbidade também é significativa com as seguintes doenças: a) depressão (15% a 20%); b) transtornos de ansiedade (em torno de 25%);5 e c) transtornos da aprendizagem (10% a 25%).6
Vários estudos têm demonstrado uma alta taxa de comorbidade entre TDAH e abuso ou dependência de drogas na adolescência e, principalmente, na idade adulta (9% a 40%). Discute-se ainda se o TDAH, por si só, é um fator de risco para o abuso ou dependência a drogas na adolescência. Sabe-se que é muito freqüente a comorbidade de TDAH e transtorno de conduta, e que o transtorno de conduta associa-se claramente a abuso/dependência a drogas.4 Dessa forma, é possível que o abuso/dependência a drogas ocorra com mais freqüência num subgrupo de adolescentes com TDAH que apresentam conjuntamente transtorno de conduta. Em outras palavras, o fator de risco não seria o TDAH em si, mas sim a comorbidade com transtorno de conduta. Portanto, esta ainda é uma questão de pesquisa em aberto.
Procedimentos para avaliação diagnóstica
Em relação à fonte para coleta de informações, sabe-se que existe baixa concordância entre informantes (criança, pais e professores) sobre a saúde mental de crianças. Estas normalmente subestimam a presença de sintomas psiquiátricos e apresentam baixa concordância teste-reteste para os sintomas de TDAH. Os pais parecem ser bons informantes para os critérios diagnósticos do transtorno.10 Os professores tendem a superestimar os sintomas de TDAH, principalmente quando há presença concomitante de outro transtorno disruptivo do comportamento. Com adolescentes, a utilidade das informações dos professores diminui significativamente, na medida em que o adolescente passa a ter vários professores (currículo por disciplinas) e cada professor permanece pouco tempo em cada turma, o que impede o conhecimento específico de cada aluno. Pelo exposto, o processo de avaliação diagnóstica envolve necessariamente a coleta de dados com os pais, com a criança e com a escola.
Com os pais, é fundamental a avaliação cuidadosa de todos os sintomas. Como em qualquer avaliação em psiquiatria da infância e adolescência, a história do desenvolvimento, médica, escolar, familiar, social e psiquiátrica da criança deve ser obtida com os pais. Em crianças pré-púberes, as quais muitas vezes têm dificuldades para expressar verbalmente os sintomas, a entrevista com os pais é ainda mais relevante. Com a criança ou adolescente, uma entrevista adequada no nível de desenvolvimento deve ser realizada, avaliando-se a visão da criança sobre a presença dos sintomas da doença. É fundamental a lembrança de que a ausência de sintomas no consultório médico não exclui o diagnóstico. Essas crianças são freqüentemente capazes de controlar os sintomas com esforço voluntário, ou em atividades de grande interesse. Por isso, muitas vezes, conseguem passar horas na frente do computador ou do videogame, mas não mais do que alguns minutos na frente de um livro em sala de aula ou em casa. Tanto na entrevista com os pais, quanto naquela com a criança, é essencial a pesquisa de sintomas relacionados com as comorbidades psiquiátricas mais prevalentes. Ao final da entrevista, deve-se ter uma idéia do funcionamento global da criança.4 A presença de sintomas na escola deve ser avaliada através de contato com os professores e não somente pelas informações dos pais, pois ou últimos tendem a extrapolar informações sobre os sintomas em casa para o ambiente escolar.
Em relação a avaliações complementares, normalmente se sugere: a) encaminhamento de escalas objetivas para a escola; b) avaliação neurológica; e c) testagem psicológica. Entre as escalas disponíveis para preenchimento por professores, apenas a escala de Conners tem adequada avaliação de suas propriedades psicométricas em amostra brasileira.11 A avaliação neurológica é fundamental para a exclusão de patologias neurológicas que possam mimetizar o TDAH e, muitas vezes, é extremamente valiosa como reforço para o diagnóstico. Os dados provenientes do exame neurológico evolutivo, principalmente a prova de persistência motora, somados aos dados clínicos, são importantes.12 No que tange a testagem psicológica, o teste que fornece mais informações relevantes clinicamente é a Wechsler Intelligence Scale for Children.13 A sua terceira edição (WISC-III) tem tradução validada para o português,14 sendo que os subtestes do WISC-III que compõe o fator de resistência à distraibilidade (números e aritmética) podem ser importantes para reforçar a hipótese diagnóstica de TDAH. Além disso, no diagnóstico diferencial da síndrome, é preciso descartar a presença de retardo mental, visto que essa patologia pode causar problemas de atenção, hiperatividade e impulsividade. Outros testes neuropsicológicos (por exemplo, o Wisconsin Cart-Sorting Test ou o STROOP Test), assim como os exames de neuroimagem (tomografia, ressonância magnética ou SPECT cerebral), ainda fazem parte do ambiente de pesquisa, e não do clínico.6
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1516-44462000000600003&script=sci_arttext
(continua)

Nenhum comentário:

Postar um comentário