O JUIZ COVARDE
Ruy Barbosa
De Anás a Herodes o julgamento de Cristo é o espelho de todas as deserções da justiça, corrompida pela facções, pelos demagogos e pelos governos. A sua fraqueza, a sua inocência, a sua perversão moral crucificaram o Salvador, e continuam a crucificá-lo, ainda hoje, nos impérios e nas repúblicas, de cada vez que um tribunal sofisma, tergiversa, recua, abdica. Foi como agitador do povo e subversor das instituições que se imolou Jesus. E, de cada vez que há precisão de sacrificar um amigo do direito, um advogado da verdade, um protetor dos indefesos, um apóstolo de idéias generosas, um confessor da lei, um educador do povo, é esse, a ordem pública, o pretexto, que renasce, para exculpar as transações dos juizes tíbios com os interesses do poder. Todos esses acreditam, como Pôncio, salvar-se, lavando as mãos do sangue, que vão derramar, do atentado, que vão cometer. Medo, venalidade, paixão partidária, respeito pessoal, subserviência, espírito conservador, interpretação restritiva, razão de estado, interesse supremo, como quer te chames, prevaricação judiciária, não escaparás ao ferrete de Pilatos! O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz cobarde."
(A imprensa, Rio, 31 de março de 1899. In: Obras Seletas de Rui Barbosa, v. 8, Casa de Rui Barbosa, Rio, 1957, pp. 67-71)
quarta-feira, março 25, 2009
O juiz covarde. Ruy Barbosa. Prosa
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