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domingo, maio 18, 2008

A CASADA INFIEL
García Lorca

Levei-a comigo ao rio,
pensando que era donzela,
porém já tinha marido.
Foi na noite de Santiago
e quase por compromisso.
Os lampiões se apagaram
e acenderam-se os grilos..
Já nas últimas esquinas
toquei seus peitos dormidos,
que pra mim logo se abriram
como ramos de jacintos.
A goma de sua anágua
soava nos meus ouvidos,
como uma peça de seda
rasgada por dez punhais.
Sem luz de prata nas copas
têm as árvores crescido,
e um horizonte de cães
ladrava longe do rio.
*
Já passadas as amoras,
os juncos e os espinhos,
sob sua mata de pêlos
fiz um fojo sobre o limo.
Eu tirei minha gravata.
Ela tirou seu vestido.
Eu o cinto com o revólver.
E ela seus espartilhos.
Nem nardos nem caracóis
têm uma cútis tão fina,
nem os cristais ao luar
relumbram com tanto brilho.
Suas coxas me escapavam
como peixes surpreendidos.,
metade cheias de lume,
metade cheias de frio.
Percorri naquela noite
o mais belo dos caminhos,
montado em poltra de nácar
sem rédeas e sem estribos.
Por homem que sou, não digo
as coisas que ela me disse.
A luz do entendimento
faz que eu seja comedido.
Suja de beijos e areia,
me fui com ela do rio.
Contra os ares se batiam
brancas espadas de lírios.
Me portei como quem sou.
Como um gitano legítimo.
Dei-lhe cesta de costura
feita de liso palhiço,
e não quis enamorar-me
porque ela, tendo marido,
me disse que era solteira
quando eu a levava ao rio.

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