Gilberto Mendonça Teles |
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TEATRO DE ARENA
Estou desempenhando o meu papel-
carbono: aqui está o seu nome
como uma tatuagem no meu peito.
Aqui, o acetinado para as suas mãos
e o aéreo para uma viagem clandestina.
Já fui como um papel almaço
muito bem pautado e com margens
para as emendas e correções.
Amanhã serei algum papel de embrulho
se não for um desses papéis de oficio
com timbre e protocolo para comunicar
oficialmente a seu marido
que entrei em gozo de férias
ou de licença-prêmio com você.
Hoje eu sei me transformar
nos papéis mais difíceis:
ser bufão como um papel bouffant,
faminto como um papel de arroz,
discreto como um papel de alcova,
fino como um papel de linha,
sensual como um papel de rolo
para as nossas abluções.
Mas também um autêntico linha-d’água
só para ver você na contraluz.
Já representei papéis estrangeiros:
China, Índia, Holanda, Japão.
Você pode fazer de mim o seu correio,
o seu papel-moeda ou papelão.
Quando você me receber, não me olhe de soslaio,
apesar de ser muito bonita esta palavra.
Me olhe de banda, que é a coisa mais linda,
e me guarde no bolso da calça, bem em cima
daquele sinal na coxa esquerda.
Depois, antes que alguma coisa aconteça,
me tire da cabeça.
Um dia,
quando a roupa voltar da tinturaria
e este poema perder seu significado,
você me encontrará todo enrugado:
— Que papel será este? E por capricho
me deitará no lixo.
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