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sexta-feira, novembro 16, 2018

Poema de cem faces. Cem Poetas.

Poema de cem faces

Cem Poetas*





Aquele rio
era como um cão sem plumas.

Ó máquina, orai por nós.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e langor.

Então, pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas.

Nós merecemos a morte,
porque somos humanos.

Todos, todos estão dormindo na colina.

Por que não dizer baixinho, como quem reza:
— Ó doce e incorruptível Aurora...

Estou sozinho na praia...
Ó mundo, vamos dançar!

O meu amante morreu bêbado,
E meu marido morreu tísico!


lamente
uma
vez

Minha alma se tornou profunda como os rios.

Pensem nas feridas
Como rosas cálidas

Meus olhos marinheiros
Pressentiram o desastre.

De onde vem essa
chuva trazida
na ventania?

Agora vire a página e olhe o anjo que ele
[ possuiu,
veja esta mantilha sobre este ombro puro

Ontem caminhei
Nos campos de chuva; hoje
chove dentro de mim.

Na gaiola cheia
(pedreiros e carpinteiros)
o dia gorjeia.

E eis que, dançando, saímos
além da sala e do tempo.

Eu boi.
Boi de mim mesmo.
Boi sonso.
Boi de canga.

Como te chamas, pequena chuva inconstante e
[ breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza? Maria?

se ao menos esta dor se visse
se ela saltasse fora da garganta como um grito

Pouco me importa.
Pouco me importa o quê? Não sei: pouco me
[ importa.

Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou.

Somos contos contando contos, nada.

A palavra passa
o gesto fica

Os soluços graves
Dos violinos suaves
Do outono

a lua sobre o mar
era um sabre
aparando a água

A perfeição reside nos tumultos, nos
escombros, nas sinopses
de um homem

Dobram sinos
batem sinos
choram alguém?

A mãe faz tricô
O filho vai à guerra
Tudo muito natural acha a mãe

Palavra carece de pátria
lugar de raiz e eleição.

Mulher jovem corpulenta sem chapéu
de avental

um casal na noite
expande o vulto duro
de uma árvore

Mas para que serve o pássaro?
Nós o contemplamos inerte.

não há um
sentido único
num
poema

Cala, poesia,
A dor dos homens não se pode exprimir em
[ nenhuma língua.

Meus pensamentos são meus camelos
Meus pensamentos são meus cavalos

Certa madrugada fria
irei de cabelos soltos
ver como crescem os lírios.

O ferro do despeito
vaza a sintaxe,
fere e desnorteia

Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança

Você não sabia? Deu no jornal:

amanheço todo dia nua e estreita
como uma rua de comércio

Aprende-se muito
com a ausência.

Por mais que eu me seqüestre, aquele rio me
[ retoma.

viver
é cobrir os outros
de cicatrizes
e ser coberto

Também não gosto.
Lendo-a, no entanto, com total desprezo, a
[ gente acaba descobrindo
nela, afinal de contas, um lugar para o
[ genuíno.

As testemunhas cegas da existência,
sempre a te olhar sem que você se importe,

O mundo começava nos seios de Jandira.

Para quem me queira ouvir:
Sou um homem aos frangalhos.

Descobre-se um amor
na iminência de perdê-lo.

E logo ela é só flama, inteiramente.

As garças não eram feitas: surgiam. Leves,
feitas de vôo

os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

Palavras, deixai-me
celebrar o vão movimento dos ponteiros do
relógio, os episódios vãos, a nossa morte.

As barcas afundadas. Cintilantes
Sob o rio. E é assim o poema. Cintilante
E obscura barca ardendo sob as águas.

E o homem disse: "As coisas tais como são

Se modificam sobre o violão".

este tiroteio de silêncios
esta salva de arrepios

pitangas no travesseiro,
cama com cheiro de fruta.

a poesia está morta

mas juro que não fui eu

O mais era morte e apenas morte

às cinco horas da tarde.

(O amor me busca

como um predador.)

O poema é antes de tudo um inutensílio.

O amolador de tesouras
atravessa a rua
atrás do assobio
do realejo.

Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.

O que esperamos na ágora reunidos?

É que os bárbaros chegam hoje.

Não posso viver comigo
Nem posso fugir de mim.

quis
mudar tudo
mudei tudo

Tive uma jóia nos meus dedos —
E adormeci —

Escrevem brancas palavras de um sal agudo
e triste. Dói olhar o mar de uma cadeira.

Virei no vento
Da primavera.
Em tua boca
Serei carícia,

Um pouco mais de sol — eu era brasa.
Um pouco mais de azul — eu era além.

Tygre! Tygre! Brilho, brasa
que a furna noturna abrasa,

A ceifeira espera
e sabe da hora
A ciência não

As folhas enchem de ff as vogais do vento.

Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

um
dois
três
o juro:o prazo

Na palma do vento
pouso a fronte. Nele confio.

Então, atiro sobre as palavras outras palavras,

Água noturna, noite líquida, afogando de apreensões
As altas torres do meu coração exausto.

Ora, a alegria, este pavão vermelho,
está morando em meu quintal agora.

Lembro-me bem. A ponte era comprida,
E a minha sombra enorme enchia a ponte,

Tudo o que vejo engulo no mesmo momento
Do jeito que é, sem manchas de amor ou desprezo.

Dói o vôo cortante desta tarde.

Tenho a rua, findando em outra rua de músculo e trégua, tenho o braço-de-ferro.

E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Nesta acumulação de corpos enfezados;

Talvez um lírio. Máquina de alvura
Sonora ao sopro neutro dos olvidos.

ir
pelo puro prazer
da paisagem

Há um tigre em casa
que dilacera por dentro aquele que o olha.

O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu

Áspera guitarra rasga o ar da praça.
Há um pássaro parado na garganta de Carmen.

Ó solidão, minha mãe,
medusa erguida sem pai.

De novo me invade.
Quem? – A Eternidade.

o real me escapa,
paródia de labirinto.

De todas as perguntas,
só quero reter a centelha.

É leve a criatura vaporosa
Como a frouxa fumaça de um charuto.

Não é minha esta casa, aí entrarei no entanto.
Quebrarei o portão, marcharei entre as flores.

Ouça
as mãos
tecendo a língua
e sua linguagem

Daquele que amo
quero o nome, a fome
e a memória.

Você é
Testemunha —
A pá é irmã do canhão.

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