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terça-feira, janeiro 23, 2018

Diário de um plantonista

Copiado da página "Diário de um plantonista":

Estava aqui lembrando dos meus tempos de faculdade...
A aprovação no vestibular após um período de dedicação exclusiva aos estudos, o primeiro dia de aula, o encontro com pessoas que iriam fazer parte do resto da minha vida. A primeira roupa branca para a aula de Anatomia Humana, a temida primeira aula desta mesma disciplina, o choque em me deparar com a realidade de que estava tudo zerado e que outra batalha se iniciaria ali, após o vestibular. Estávamos todos entre os melhores daquele ano e ali éramos apenas mais um.
A primeira aula prática, o primeiro contato com o cheiro do formol, o impacto ao ver o cadáver, que silenciosamente nos causava medo por ser desconhecido. Os inúmeros nomes de ossos, tubérculos, sulcos. A origem e inserção de músculos. As inúmeras veias, artérias, seus ramos e tributárias. A difícil memorização de tudo o que era novo. Depois viriam as primeiras provas, as longas madrugadas de estudos, os estudos em grupo, as perguntas de rodapé que nossos professores adoravam cobrar, as palmas na hora da prova prática da Anatomia. O desespero das primeiras notas baixas. A sensação de impotência de muitas vezes.
Devagar, engatinhando, a gente acaba pegando o ritmo. A gente se acostuma em conviver a maior parte dos nossos dias em grupo. A gente divide carona para ir pra faculdade, a gente almoça junto, lancha junto, tira xerox junto, chora junto e ri muito junto. A gente vai se tornando uma família.
Nesse contexto, surgem verdadeiras identificações. Surgem os nossos grandes amigos. Nossos irmãos por afinidade. E surgem também algumas paixões. As festas, os bebe-esqueces pós-provas, as paqueras, os inícios de namoros e até futuros casamentos. Os desentendimentos. O egoísmo de alguns, as brigas por bobagens.
E o tempo vai passando, de repente nos vemos em contato com o paciente. Uma época mágica, com o cenário hospitalar tão sonhado. As primeiras anamneses, os primeiros exames físicos, cautelosos. As avaliações, o dividir nossos dias com residentes, enfermeiros e nossos novos amigos: os pacientes. A gente vai se apegando a tudo isso. E vai crescendo.
Depois surgem novas infinitas disciplinas, que permanecem a perturbar o sono. E a gente vai tentando assimilar o máximo de informações, mas não tem jeito, a sensação de não saber quase nada continua a pairar sobre nossas mentes. Provas, seminários, provas e mais provas. Mas a gente sempre consegue sair vivo deles.
Aí vem o sonhado internato. Somos quase médicos, mas permanecemos com todas as inseguranças de outrora. Prestes a conquistar nossos diplomas, bate aquela sensação, novamente, de impotência: será que eu vou saber tratar meus futuros pacientes? E se ele tiver algo que eu nunca li ou ouvi falar? Normal, todo mundo passa por isso. E ai entre uma sutura e outra, entre algumas boas preceptorias e outras, entre uma cirurgia e outra, um estágio e outro, a gente vai, aos poucos, decidindo o que vai seguir dali em diante. Uns já sabem desde sempre. Outros precisam decidir. E outros têm uma ideia do que poderá ser, mas a certeza mesmo só vai ter vivendo.
E vem a formatura. Os gastos para as solenidades. As gordinhas e gordinhos emagrecem. Todo mundo quer estar bonito para as fotos de conclusão do curso. A euforia, a felicidade. A sensação de etapa vencida. O medo, a angústia, o desespero. E vivemos aqueles momentos intensamente. Felizes da vida. Realizados. Comemoramos, brindamos, vibramos. E de repente, tudo acaba. Cada um vai para um lado, cada um passa em uma prova.
Alguém engravida. Alguém casa. Você vira padrinho dos filhos dos amigos. Você vira padrinho de casamento. Você intensifica laços com uns, folga laços com outros. Tem gente que você nunca mais vai ver. Outros que farão parte da sua vida principalmente por telefone. Você sonha em marcar um novo encontro, mas as agendas não batem. Você sente saudades das pessoas, que de desconhecidos se tornaram mais que conhecidos. Você se apega. Você sente saudades.
Você também sente orgulho dos seus colegas de faculdade sendo aprovados nas melhores residências do País. Você sente orgulho quando percebe que cada um segue o seu caminho e por exercer o seu talento com dedicação, brilha. Eu tenho orgulho da minha turma. Eu também tenho saudades dela. Eu também queria rever as pessoas.
A faculdade é uma época mágica, de sonhos, realizações e descobertas. Nosso grande e verdadeiro período de crescimento. Que nos marca para sempre. Que nos dá saudades e a certeza de que tudo valeu a pena.
Aos meus amigos, meu carinhoso, fraterno e saudoso abraço.

Dr. Greg, do Diário de um Plantonista.

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