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sábado, março 31, 2012

Casablanca. Cinema.

A esperança. Augusto dos Anjos.

A ESPERANÇA
Augusto dos Anjos

A esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a crença.
Vão-se sonhos nas asas da descrença,
Voltam sonhos nas asas da esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,
Sirva-te a crença de fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro - avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da morte a me bradar: descansa!

A trasnfiguração. Rafael.


Se soubéssemos, teríamos sido pais diferentes.

"Enquanto cuidávamos da vida, nosso filho aprendia a andar de bicicleta. Quando nos veio contar que podia andar sem rodinhas, não demos importância. Até hoje ele vive em busca da aprovação que não teve.
Enquanto propúnhamos alvos elevados, nosso menino chegou com o seu boletim: tirou nove. E o que dissemos: "eu esperava que você tirasse 10"". E ele passou toda a sua vida procurando..."
Israel Belo de Azevedo

O poeta refrigera a alma.


O poeta refrigera a alma., upload feito originalmente por Charles Fonseca.

A terna voz do Salvador.

87. Os fiéis, lembrando-se da palavra de Cristo aos Apóstolos: «Quem vos escuta escuta-me a Mim» (Lc 10, 16) (53), recebem com docilidade os ensinamentos e as directrizes que os seus pastores lhes dão, sob diferentes formas.

88. O Magistério da Igreja faz pleno uso da autoridade que recebeu de Cristo quando define dogmas, isto é, quando propõe, dum modo que obriga o povo cristão a uma adesão irrevogável de fé, verdades contidas na Revelação divina ou quando propõe, de modo definitivo, verdades que tenham com elas um nexo necessário.
Catecismo.

União da Terra e da Água. Peter Paul Rubens


AOS POUCOS
Charles Fonseca

Aos poucos, deixo de sentir saudade
Pouco a pouco meu peito se esvazia
De esperar por algo que eu não via
E só agora vejo ao fim da tarde.

Aos poucos, o olhar encandeado
Por luzes reflexas da cor do ouro
Liberto fica do que foi desdouro
Do dito, do não dito, recalcado.

Aos poucos eis que já o dia finda,
Deixo de ver o sol já no poente.
Mas tantos sóis agora reluzentes
Cintilam no meu céu, na alma minha!

sexta-feira, março 30, 2012

Paraiba. Luiz Gonzaga.

O combate. Josué Montello.

O combate

Josué Montello


Na véspera do combate, quando a lua despontou por cima dos contrafortes da serra do Medeiro, já encontrou as tropas do Capitão Nelson de Melo a poucos quilômetros do lugar escolhido para o duplo movimento - de vanguarda e retaguarda - contra as forças governistas. O batalhão marchava em silêncio, cobrindo a picada no passo certo da marcha, de baterias prontas para a ofensiva, enquanto a cavalaria se alongava em fila indiana, com os animais de orelhas fitas, rédeas soltas, batendo cadenciadamente os cascos nas pedras do chão. Adiante, nas carretas vagarosas, seguiam dois canhões, ladeados por quatro artilheiros.

Por volta das dez e meia, o batalhão parou para acampar. Dali se podia ver, banhada pela claridade do luar, a silhueta compacta das montanhas fechando o cenário da luta. Ocultos pela vegetação das encostas, já os canhões inimigos espreitariam, alongando o pescoço comprido, prontos para atirar.

João Maurício, que dispensara a barraca de campanha, preferira ficar ao relento, na companhia de seus soldados, sentindo à sua volta a noite imensa e clara. Jamais tinha visto outra assim. Afeito a galgar escarpas e desfiladeiros, vivia agora uma emoção diferente, com aquela luz úmida, aquele silêncio espaçoso, aquelas cumeadas, aquelas árvores que a brisa balouçava. Por terra, junto aos fuzis e às mochilas, jaziam os companheiros adormecidos, agasalhados nas mantas e nos capotes, sem que se lhes ouvisse o ressonar sobressaltado. Parecia a João Maurício que, afora as sentinelas, que se mantinham alerta nos postos avançados, somente ele permanecia vigilante, àquela hora tardia, sentado no chão, com as mãos frias escorando o corpo, que se reclinava para trás. Apesar da marcha longa, não sentia sono nem cansaço. Aquela vigília não seria um aviso de que seu fim se aproximava? Entregava-se às mãos de Deus, convicto de que tomara o partido da boa causa. E alongava para os alcantis a vista insone. A noite, olhada daquela iminência, com as montanhas empinadas sob a luz alvacenta, tinha a imponência inaugural do mundo primitivo, como se Deus houvesse acabado de fazer tudo aquilo. Aqui, além, esguios pinheiros imóveis, perfilados no sopé das encostas, abriam-se no alto, como em gesto de oferenda. Com o passar das horas, a luz adquiria gradações novas. A própria lua, suspensa sobre a crista da serra, dava a impressão de buscar alguma coisa na claridade fosca, com um ar de notívaga assustada.

Nisto João Maurício percebeu que um vulto se movia ao seu lado, firmando as mãos no solo para erguer a cabeça, e logo reconheceu o Cabo Ruas, que por fim se sentou, esticando os braços curtos:

— Não quis dormir, Tenente? Eu passei pelo sono. Em noites assim, durmo e acordo, durmo e acordo. Tomara que esta briga acabe depressa. Já estou sentindo a falta de casa. Vou brigar ainda um mês ou dois, depois pego licença: já está em tempo de ver minhas crianças. Agora mesmo sonhei com a patroa. Ela fazia um festão com a minha chegada.

E após um silêncio longo, olhando a noite erma:

— Isto aqui mete medo. Aquela montanha ali, muito escura, muito alta, parece que está de dedo empinado, ralhando com a gente. E olhe o vento assobiando. Deus não pode ter inventado a guerra, Tenente. Isto é coisa do Diabo. Eu, aqui, com o meu fuzil, e o senhor, aí, com a sua pistola, só estamos pensando em matar para não ser morto. Deus disse: "Não matarás." E nós, aqui, não fazemos outra coisa. Acho que foi esse pensamento que me tirou o sono. Estou dizendo besteira, Tenente? João Maurício bateu-lhe no ombro:

— Não. Mas trata de dormir. Precisas estar descansado, e eu também. Fica quieto.

E alongou-se ao comprido do chão, com o rosto voltado para o céu, como em busca das estrelas, enquanto o Cabo Ruas se deitava de borco com a cabeça no braço dobrado. Mas, mesmo quieto, João Maurício não dormiu. Para os lados de Belarmino, voltavam a retumbar tiros isolados, que as montanhas repetiam.

— Boa-noite, Tenente.

— Boa-noite, Ruas.

E João Maurício, com as mãos sob a nuca, ia vendo farrapos de nuvens que o vento levava. Quando a luz da aurora se espalhasse por aquelas alturas, haveria sangue no horizonte, por cima das árvores, e sangue na terra, com os primeiros mortos e feridos. Os cavalos se precipitariam sobre o verde dos desfiladeiros, e muitos deles relinchariam, ouvindo o toque das cornetas, por entre o rugir dos canhões, o sibilar das balas, e o estrugir nervoso da metralha. E tanto de um lado quanto de outro, os corpos iriam tombando, à proporção que o dia fosse crescendo.

Sem perceber a transição da vigília para o sono, João Maurício deixou cair pesadamente as pálpebras, e só voltou a si com o Ruas a lhe sacudir o braço:

— Depressa, Tenente: o ataque está começando.

De um salto, ele ficou de pé, ouvindo em redor o alvoroço dos companheiros que se apresentavam para o combate. Na manhã ainda clareando, estrondavam as primeiras cargas cerradas do bombardeio inimigo. Soavam longe os clarins e as cornetas. Alguns cavalos galopavam, outros relinchavam com o repuxo das rédeas e o toque das esporas. E as granadas não tardaram a explodir ali no alto, arrancando touceiras de mato e salpicos de terra revolvida. De vez em quando, um grito. E os canhões rugiam dos dois lados, escancarando na luz atônita o clarão instantâneo das balas detonadas.

Após a desordem assustada dos momentos iniciais de luta, uma ordem natural ia-se impondo — com os soldados nas posições de combate, a resposta rápida dos tiros, o corpo-a-corpo que lá adiante se travava, a arremetida dos cavalarianos, os grupos que se infiltravam pelos capões de mato e pelo aclive das ribanceiras. A cada instante, uma nova ordem da corneta. Novas cargas cerradas. As granadas de mão que se amiudavam, e já um ou outro soldado inimigo tentava infiltrar-se nas linhas rebeldes, enquanto a luz da manhã crescia e se alastrava.

Rideau, Cruchon et Compotier. Paul Cézanne. Pintura


Lady Godiva. John Collier. Pintura


85. «O encargo de interpretar autenticamente a Palavra de Deus, escrita ou contida na Tradição, foi confiado só ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade é exercida em nome de Jesus Cristo (51), isto é, aos bispos em comunhão com o sucessor de Pedro, o bispo de Roma.
86. «Todavia, este Magistério não está acima da Palavra de Deus, mas sim ao seu serviço, ensinando apenas o que foi transmitido, enquanto, por mandato divino e com a assistência do Espírito Santo, a ouve piamente, a guarda religiosamente e a expõe fielmente, haurindo deste depósito único da fé tudo quanto propõe à fé como divinamente revelado» (52)

Catecismo.

Jesus, teu nome satisfaz. Hino.

O cálice transborda

O CÁLICE TRANSBORDA
Charles Fonseca

Afastem de mim este cálice
Do estar distante odioso
Eu estou salvo idoso
Do desamor, afaste-se.

Tragam pra mim este cálice
De só falar de amores
De só odiar rancores
Do só a vós amar, fale-se.

Ceia na casa de Emaús. Caravaggio.


quinta-feira, março 29, 2012

Árvore da vida.

ÁRVORE DA VIDA
Charles Fonseca

Dura lhe tem sido a vida, agreste.
Finca suas raízes no chão duro.
Dele traz em seiva ao futuro
Copas superpostas pro celeste.

O caule se o vês já carcomido
Assim está por muito ter vivido.
Forte ele é, sob ele há vida.
Dele, em volta, a sombra te abriga.

Que tal um cinema?

Clique: http://www.portacurtas.com.br/beta/filme/?name=dedicatorias

Aquiles. Mitologia.

Aquiles - o mito do signo de Câncer

Tétis, a deusa do mar, era desejada como esposa por Zeus e por seu irmão Poseidon. Porém Prometeu profetizou que o filho da deusa seria maior que seu pai, e diante disso os deuses resolveram dá-la como esposa a Peleu, um mortal já idoso, intencionando enfraquecer o filho que dela nasceria e seria apenas um humano.

Nasceu Aquiles e Tétis visando fortalecer sua natureza mortal, mergulhou-o, ainda bebê, nas águas do mitológico rio Estige. As águas o tornaram um herói invulnerável, exceto no calcanhar, por onde a mãe o segurou para o mergulhar no rio, daí a famosa expressão “calcanhar de Aquiles”, significando ponto vulnerável.

Aquiles tornou-se o mais poderoso dos guerreiros, porém, ainda era mortal. Mais tarde, sua mãe profetiza que ele poderia escolher entre dois destinos: lutar em Tróia, alcançar a glória eterna mas morrer jovem, ou permanecer em sua terra natal e ter uma longa vida, mas sendo logo esquecido. Aquiles preferiu a glória...

http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/search/label/Mito%3A%20Aquiles%20e%20as%20vulnerabilidades%20humanas%20mito%20do%20signo%20de%20c%C3%A2ncer

Ícone da Santíssima Trindade por Andrei Rublev


Piatã.

PIATÃ
Charles Fonseca

Na praia de Piatã
Encontraram-se duas almas
Vento balança as palmas
Sol de manhã louçã

Duas almas um destino
Atrás si u'a tradição
Fé no além no agora então
A paixão em torvelinho

Põe dois corpos a vagar
A brisa por viração
Gira um mundo de emoção
Por Deus, cupido a brincar!

A Chave do Enigma. Fernando Sabino.

A Chave do Enigma
(trechos)
Fernando Sabino

Minas


O TURISTA perguntou ao mineiro por que o Estado de Minas Gerais é conhecido como "As Alterosas".

— Sei não — foi a resposta. — Vai ver que é por causa das mulheres mineiras, que são muito alterosas. Basta uma para dar logo alteração.


CAMINHANDO pelas ruas de São João del Rei. Uma dor de cabeça renitente pede com urgência um comprimido. Se fosse dor de dente, pediria Cera Dr. Lustosa. Ainda há em São João quem se lembre do próprio Dr. Lustosa, criador da milagrosa cera, cujo cheiro característico me vem da infância. Não encontro nenhuma farmácia aberta. Abordo um passante, que me informa polidamente haver uma de plantão perto da Estação Rodoviária.

— E é muito longe a Rodoviária? — pergunto.

— É — responde ele apenas, e prossegue o seu caminho.


SABARÁ é a terra da jabuticaba. De repente, em certa época do ano, Belo Horizonte se esvaziava: todo mundo vinha a Sabará chupar jabuticabas, que eram vendidas no pé. O freguês chupava quantas quisesse, até cair do galho. Só não podia levar nenhuma.

Há algum tempo um velho coronel mineiro, intrigado, perguntava:

- Todo mundo agora está indo para a Europa: o Juca já foi, o seu Chiquinho também, o Zé da Sá Rita está de mala pronta... É tempo de jabuticaba lá?


NO QUE eu depender de informações desses meus conterrâneos, acabo indo parar na casa da mãe Joana. Pergunto a este outro, no posto de gasolina, a distância dali até Diamantina.

— Não é muito perto não. Mas também não é longe — informa ele, sério.

— Quanto tempo vou levar daqui até lá?

— É conforme, uai. Se correr muito, leva pouco, se correr pouco, leva muito.


OS BECOS em Diamantina conservam os nomes da época do ouro e dos diamantes: Beco das Caveiras, das Gaivotas, da Tasca, do Rapacuia, da Paciência, do Pinta-Ratos. Cada um com sua motivação histórica: o do Pinta-Ratos, por exemplo, é homenagem a um pintor que, para se vingar da Irmandade que lhe devia um dinheiro, trancou-se na sacristia da igreja e pintou dezenas de ratos em suas paredes; o da Paciência era usado para despejo do lixo e pelos tropeiros, que ali satisfaziam suas necessidades — paciência houvesse para passar por ali.


— SE sou mineiro? Bem, é conforme.

Tudo é conforme: sabe-se lá por que estão perguntando? ? O que é ser mineiro, afinal? Basta ter nascido em Minas? Manhoso, ladino, cauteloso, desconfiado — tudo isso junto. Experimente perguntar-lhe com delicadeza:

— Como é mesmo o seu nome todo?

Ele responderá, também delicado:

— Fale a parte que você sabe.

Se por sua vez não perguntar:

— Por que você quer saber?


TUDO que me ocorre dizer sobre o mineiro já foi dito, contado e recontado. Só mesmo me valendo mineiramente do que já escrevi sobre o enigma de Minas:

"Dentro de mim uma corrente de nomes e evocações fluindo desde as minhas origens, como o Rio das Velhas no seu leito de pedras, entre cidades imemoriais... Prefiro estancá-la no tempo, a exaurir-me em impressões arrancadas aos pedaços e que aos poucos descobririam o que resta de precioso em mim - o mistério de minha terra, desafiando-me como a esfinge com seu enigma: decifra-me ou devoro-te.

Prefiro ser devorado."

Torre de Babel por Pieter Brueghel, o Velho


84. O depósito da fé (49) («depositum fidei»), contido na Tradição sagrada e na Sagrada Escritura, foi confiado pelos Apóstolos ao conjunto da Igreja. «Apoiando-se nele, todo o povo santo persevera unido aos seus pastores na doutrina dos Apóstolos e na comunhão, na fracção do pão e na oração, de tal modo que, na conservação, actuação e profissão da fé transmitida, haja uma especial concordância dos pastores e dos fiéis» (50).
Catecismo.

O estranho em nossa família.

O ESTRANHO


Alguns anos depois que nasci, meu pai conheceu um estranho, recém-chegado à nossa pequena cidade.
Desde o princípio, meu pai ficou fascinado com este encantador personagem, e em seguida o convidou a viver com nossa família.
O estranho aceitou e desde então tem estado conosco.
Enquanto eu crescia, nunca perguntei sobre seu lugar em minha família; na minha mente jovem já tinha um lugar muito especial.
Meus pais eram instrutores complementares:
Minha mãe me ensinou o que era bom e o que era mau e meu pai me ensinou a obedecer.
Mas o estranho era nosso narrador.
Mantinha-nos enfeitiçados por horas com aventuras, mistérios e comédias.
Ele sempre tinha respostas para qualquer coisa que quiséssemos saber de política, história ou ciência.
Conhecia tudo do passado, do presente e até podia predizer o futuro!
Levou minha família ao primeiro jogo de futebol.
Fazia-me rir, e me fazia chorar.
O estranho nunca parava de falar, mas o meu pai não se importava.
Às vezes, minha mãe se levantava cedo e calada, enquanto o resto de nós ficava escutando o que tinha que dizer, mas só ela ia à cozinha
para ter paz e tranquilidade. (Agora me pergunto se ela teria rezado alguma vez, para que o estranho fosse embora).
Meu pai dirigia nosso lar com certas convicções morais, mas o estranho nunca se sentia obrigado a honrá-las.

As blasfêmias, os palavrões, por exemplo, não eram permitidos em nossa casa… Nem por parte nossa, nem de nossos amigos ou de qualquer um que nos visitasse. Entretanto, nosso visitante de longo prazo, usava sem problemas sua linguagem inapropriada que às vezes queimava meus ouvidos e que fazia meu pai se retorcer e minha mãe se ruborizar.
Meu pai nunca nos deu permissão para tomar álcool. Mas o estranho nos animou a tentá-lo e a fazê-lo regularmente.
Fez com que o cigarro parecesse fresco e inofensivo, e que os charutos e os cachimbos fossem distinguidos.
Falava livremente (talvez demasiado) sobre sexo. Seus comentários eram às vezes evidentes, outras sugestivos, e geralmente vergonhosos.
Agora sei que meus conceitos sobre relações foram influenciados fortemente durante minha adolescência pelo estranho.
Repetidas vezes o criticaram, mas ele nunca fez caso aos valores de meus pais, mesmo assim, permaneceu em nosso lar.
Passaram-se mais de cinquenta anos desde que o estranho veio para nossa família. Desde então mudou muito; já não é tão fascinante como era ao principio.
Não obstante, se hoje você pudesse entrar na guarida de meus pais, ainda o encontraria sentado em seu canto, esperando que alguém quisesse escutar suas conversas ou dedicar seu tempo livre a fazer-lhe companhia...
Seu nome?
Nós o chamamos Televisor...
Pede-se que este artigo seja lido em cada lar.


Obs.:
Agora, este Televisor tem uma esposa que se chama Computador, e um filho que se chama Celular!
Acho que devemos ter muito cuidado com estes dois novatos, já que o primeiro foi a lareira da sala de visitas de nossas vidas, onde queimamos nossas raízes...

(autor desconhecido)

Onde está você? Mariana Aydar.

quarta-feira, março 28, 2012

"Anatomia é uma coisa que os homens também têm, mas que, nas mulheres, fica muito melhor". Millor.

O povoamento da Terra. Clique na imagem.


Aviso aos navegantes: peso argentino 0,35 do real.

O aboio do vaqueiro nordestino.

Mesa farta para todos. João Ubaldo Ribeiro.

Mesa farta para todos

João Ubaldo Ribeiro


Leio no Guinness que o francês Michel Lotito, nascido em 1950, come metal e vidro desde os 9 anos de idade. Um quilo por dia, quando está disposto. Informa-se ainda que, de 1966 para cá, ele já comeu dez bicicletas, um carrinho de supermercado, sete aparelhos de televisão, seis candelabros e um avião Cessna leve — este ingerido em Caracas, embora o livro não revele por quê. Sim, e comeu um caixão de defunto, com alça e tudo, a fim de garantir um lugar na História como o primeiro homem a ter um caixão de defunto por dentro, e não por fora.

Se é chute, não sei, mas não deve ser, levando em conta o rigor do Guinness. E esse tipo de coisa é menos raro do que se pensa. Nunca participei de comilanças de cacos de telha ou de torrões de barro, mas muitos amigos meus, na infância; às vezes traçavam até um tijolinho. E um outro amigo, poeta etíope que conheci nos Estados Unidos, me contou que, na tribo dele, os Galinas, todas as famílias tinham pelo menos um maluco, de quem se orgulhavam muitíssimo, porque maluco é visto como uma pessoa superior. Na sua própria família, havia diversos, embora um primo fosse favorito, pelo seu alto nível.

— Qual é a maluquice dele?

— Ah, ele come qualquer coisa. Você bota um troço na frente dele, ele pergunta se é para comer, você diz que é e ele come. Ele come comida normal também, mas se, depois de ele esvaziar o prato, você diz que pode comer o prato, ele come o prato. Come pneu, chifre, couro, madeira, qualquer coisa, nunca decepcionou.

Um certo Dr. Buckland, inglês do século XIX, ficou, digamos, famoso por sua determinação em comer amostras de todo o reino animal. Morava perto do zoológico de Londres e, quando um animal adoecia, entrava em prontidão. Se o bicho morria, ele comia e dizem que, certa feita, durante uma ausência dele, um leopardo morreu e ele, ao regressar,. não vacilou: desenterrou o leopardo e comeu um filezinho. Afirmava que o pior sabor era o da toupeira, mas depois mudou de idéia, porque achou a mosca-varejeira pior.

Em algum lugar do mundo ou outro (geralmente a China não há quem tenha ido à China e não traga uma história culinária provocante), são itens do passadio, ou finas iguarias, lagartas, larvas, sangue fresco, banha derretida, gafanhotos, ovos de cobra com cobrinhas dentro, caça em decomposição, fígado de foca cru, baba de andorinha, ovo podre e assim por diante. Para não falar nos esforços de cientistas mais ou menos renomados, que se bateram seriamente contra os tabus alimentares. Mero preconceito, manter excelentes fontes de proteína escandalosamente ignoradas, a exemplo de ratos, baratas e gente morta de causas não contagiosas, como propôs outro inglês, cujo nome agora esqueci. Na Bahia, não faz muito tempo, apareceu um japonês com amostras de vinho de — como direi? —, é isso mesmo, vinho de cocô. Segundo ele, era coisa da melhor qualidade, da mesma forma que bife de cocô, cuja tecnologia ele já dominava. Depois de higienizado e processado, o bife, garantia ele, era mais nutritivo e gostoso do que muita picanha aí. Besteira desperdiçar tanta comida boa por causa de uma ojeriza sem fundamento científico.

Por aí vocês vêem as dificuldades que o povo causa. Se fôssemos um povo de mente mais aberta, não existiria o problema da fome, que tantos embaraços traz aos nossos governantes em conferências internacionais. Temos ratos, baratas, piolhos, capim (outro japonês sugeriu capim, que também dá um bife de truz), temos tudo em abundância, notadamente a matéria-prima daquele vinho. Meu único receio é que, se der certo. tabelem o rato, a barata e o capim, cobrem IPI e ICM de todo mundo que for ao banheiro e regulamentem a captura de moscas com fins alimentícios. Mas vamos ter fé nos homens. Talvez eles livrem a cara do pequeno produtor, o que já é um grande passo e mostra sensibilidade para com os problemas da maioria do bravo povo brasileiro. Agora, sem boa vontade para colaborar e aceitar alguns pequenos sacrifícios, não se resolve nada.

Aquiles e as relações entre pais e filhos. Mitologia.

Aquiles e as relações entre pais e filhos


Aquiles, o grande herói da mitologia, era filho de Tétis e Peleu. Quando Aquiles nasceu, seu pai confiou-o para ser criado e educado por Kiron. O centauro se encarregou da educação do jovem alimentando-o com mel de abelhas, medula de ursos e de javalis e vísceras de leões. Ao mesmo tempo, iniciou-o na vida rude em contato com a natureza, exercitou-o na caça, no adestramento dos cavalos, na medicina, na música e, principalmente, obrigou-o a praticar a virtude.

O jovem Aquiles tornou-se um adolescente belo, loiro e de olhos vivos. Intrépido, era simultaneamente capaz da maior ternura e da maior violência, por isso seu pai o enviou a um segundo preceptor, Fénix, um homem de grande sabedoria, que instruiu o príncipe nas artes da oratória e da guerra, juntamente com Pátroclo, filho de Menécio Rei de Locrida.

Quando Aquiles tinha nove anos de idade, Calcas - o adivinho - declarou que Tróia só poderia ser tomada com a ajuda de Aquiles, mas sua mãe pressentia que Aquiles morreria na guerra. Apavorada, Tétis vestiu seu filho como uma menina e o enviou para a corte do Rei Licomedes na ilha de Esquiro, para que ele fosse educado no Gineceu junto às filhas virgens do rei, disfarçado com o nome de Pirra - a loira ou ruiva.

Quando os gregos foram à corte de Peleu procurar por Aquiles, não o encontrando recorreram a Calcas que revelou-lhes a trama. Disfarçado de mercador, Odisseu foi ao palácio de Licomedes conseguindo entrar no Gineceu. Ele expôs, perante os olhos maravilhados das princesas, os mais ricos adornos. Entre os tecidos e as jóias estavam escondidos um escudo e uma lança. Odisseu fez soar a trombeda da guerra e imediatamente a pretensa Pirra correu para se armar. Assim Aquiles se revelou.

Aquiles retornou para junto de seus pais. Deidamia, uma das filhas de Licomedes, há muito tempo conhecia a verdadeira identidade de Aquiles. Ela mantinha um relacionamento oculto com ele e estava grávida, mas o nascimento da criança só ocorreu após a partida do herói. A criança recebeu o nome de Neoptólemo com o alcunha de Pirro. Tétis lamentou o insucesso do seu estratagema e fêz insistentes recomendações a seu filho, de que sua vida seria tanto mais longa quanto mais obscura ele a mantivesse, mas Aquiles optou pela glória tornando-se um dos mais belos herois da Guerra de Troia e um dos seus melhores guerreiros.

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Essa parte do mito de Aquiles retrata o relacionamento entre pais e filhos adolecentes. A família é a base da sociedade; é o lugar onde se desenvolvem as estruturas psíquicas e onde a criança forma a sua identidade e desenvolve o seu emocional. É na família que se determinam as funções, papéis e a hierarquia entre seus membros, sendo também o espaço social da confrontação de gerações e onde o masculino e o feminino definem suas diferenças e as relações de poder.

Cabe aos pais educar os filhos; a educação é a condição básica para o convívio social. Educar implica o uso de autoridade para estabelecer limites. Toda criança nasce egoísta e ela passa a respeitar o outro através da educação, da disciplina e, principalmente, pelo exemplo dos pais. As crianças se identificam com um dos pais e fazem o que esse adulto faz.

Quando os filhos são pequenos, os pais tem plenos poderes sobre os seus filhos e podem ainda decidir o que, quando e como as coisas podem ser feitas. Os pais tomam as decisões que julgam mais apropriadas e as crianças vivem confortavelmente essa relação de dependência desde que tenham suas necessidades básicas atendidas. Mas os filhos crescem e chegam à fase da adolescência, dando início a uma série de conflitos entre pais e filhos.

A maioria dos pais tem dificuldade em aceitar que seus filhos crescem e que passam a pensar por si mesmos. Admitir que eles estão crescendo muitas vezes significa que os pais estão envelhecendo. Muitos pais não aceitam perder o posto de heróis dos filhos, não suportam que os jovens possam ter um olhar crítico sobre eles. Crescendo, os filhos passam a enxergar os pais como pessoas, com qualidades e defeitos.

Alguns pais podem querer controlar de modo exagerado a vida dos filhos, não respeitam sua privacidade, perseguem seus passos tentando com isso evitar que eles cresçam e usam como justificativa os perigos do mundo. Na verdade, os pais tentam proteger os filhos e evitar sofrimentos futuros e se esquecem que a única forma de aprender a viver é vivendo. É isso que termina ocasionando os conflitos entre os pais e os filhos adolescentes.

O conflito entre gerações sempre existiu e os impulsos de rebeldia se formam quando os adolescentes formam seus valores, nada mais natural que jovens e adultos tenham uma visão diferente do mundo. Alguns conflitos são inevitáveis, mas muitos podem ser solucionados com um bom diálogo e respeito mútuo. A comunicação entre pais e filhos exige escuta ativa, livre expressão de sentimentos e busca ativa de entendimento mediante negociação e compromisso.

Desenvolver a habilidade de comunicação produz recompensas imediatas e a longo prazo. A comunicação tem grande impacto na saúde física e mental da família e influencia do modo como seus membros lidam com suas emoções. Isso pode afetar as atitudes, a auto-estima e a reação a situações estressantes. Se o prazer do relacionamento afetivo saudável for substituído por conflitos sem solução adequada, a família sem dúvida será infeliz.

Quando os pais apoiam seus filhos, dentro de regras razoáveis, eles promovem a segurança que os filhos precisam para seguir suas opções de vida. Quando os pais aceitam as resoluções conjuntas e conciliatórias, buscando criar soluções junto com os filhos, se estabelece o diálogo e a compreensão. Compete aos pais facilitar esse relacionamento com flexibilidade e espírito jovial. Educar com liberdade e ensinar aos filhos administrar a vida com responsabilidade é a melhor forma para desenvolver a confiança e consolidar a amizade entre pais e filhos.

http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/search/label/Mito%3A%20Aquiles%20e%20as%20rela%C3%A7%C3%B5es%20entre%20pais%20e%20filhos

Rocha eterna.

83. A Tradição de que falamos aqui é a que vem dos Apóstolos. Ela transmite o que estes receberam do ensino e do exemplo de Jesus e aprenderam pelo Espírito Santo. De facto, a primeira geração de cristãos não tinha ainda um Novo Testamento escrito, e o próprio Novo Testamento testemunha o processo da Tradição viva.

É preciso distinguir, desta Tradição, as «tradições» teológicas, disciplinares, litúrgicas ou devocionais, nascidas no decorrer do tempo nas Igrejas locais. Elas constituem formas particulares, sob as quais a grande Tradição recebe expressões adaptadas aos diversos lugares e às diferentes épocas. É à sua luz que estas podem ser mantidas, modificadas e até abandonadas, sob a direcção do Magistério da Igreja.
Catecismo.

Hieronymus Bosch


Mil perdões. Chico Buarque.

Mil Perdões
Chico Buarque

Te perdôo
Por fazeres mil perguntas
Que em vidas que andam juntas
Ninguém faz
Te perdôo
Por pedires perdão
Por me amares demais

Te perdôo
Te perdôo por ligares
Pra todos os lugares
De onde eu vim
Te perdôo
Por ergueres a mão
Por bateres em mim

Te perdôo
Quando anseio pelo instante de sair
E rodar exuberante
E me perder de ti
Te perdôo
Por quereres me ver
Aprendendo a mentir (te mentir, te mentir)

Te perdôo
Por contares minhas horas
Nas minhas demoras por aí
Te perdôo
Te perdôo porque choras
Quando eu choro de rir
Te perdôo
Por te trair

Mil perdões. Chico Buarque. Música

Enfim.

ENFIM
Charles Fonseca

De todo o mal que eu já causei
eu peço que seja perdoado
sejam em cinzas os meus pecados
enquanto é tempo e em grei

peçam os irmãos também pra mim
o bem amar da comunhão
a verdade, a libertação,
ter e dar felicidade, enfim.

terça-feira, março 27, 2012

A Última Comunhão e Martirio de San Denis, por Henri Bellechose, 1416


Como a noite descesse... Emílio Moura.

Como a noite descesse...
Emílio Moura


Como a noite descesse e eu me sentisse só, só e desesperado diante dos horizontes que se fechavam
gritei alto, bem alto: ó doce e incorruptível Aurora! e vi logo
só as estrelas é que me entenderiam.

Era preciso esperar que o próprio passado desaparecesse,
ou então voltar à infância.
Onde, entretanto, quem me dissesse
ao coração trêmulo:
- É por aqui!

Onde, entretanto, quem me dissesse
ao espírito cego:
- Renasceste: liberta-te!

Se eu estava só, só e desesperado,
por que gritar tão alto?
Por que não dizer baixinho, como quem reza:
- Ó doce e incorruptível Aurora...

se só as estrelas é que me entenderiam?

Qual a origem do samba?

Ranking com as 100 melhores cidades do Brasil para se viver e morar. Meio ambiente.

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Aporia, o daimon da dificuldade. Mitologia.

Aporia, o daimon da dificuldade


Aporia era um daimon da dificuldade, a perplexidade e da impotência. Ela estava intimamente associada com Amekhania, o desamparo. Seu homólogo era Poros, o discernimento. Certo dia, enquanto Hércules caminhava por uma passagem estreita ele encontrou Aporia que tentava obstruir seu caminho. Como era pequena, Hércules tentou esmagá-la com seus grandes pés mas cada vez que que tentava esmagá-la, Aporia dobrava seu tamanho.

Aporia expandiu a tal ponto que bloqueou a estreita estrada. Hércules não conhecia Aporia e ficou espantado com aquele fato. Pedindo ajuda, Athena veio em seu socorro dizendo-lhe:

- Hércules, não fique tão surpreso. Essa coisa que trouxe a sua confusão é Aporia - a dificuldade. Se você deixá-la sozinha, ela naturalmente diminuirá seu tamanho. Ultrapasse-a e siga seu caminho, não se detenha diante dela. Mas se você decidir combatê-la, então ela se tornará sempre maior, pois sua finalidade é impedir que você prossiga!

*********************

O mito de Aporia é um simbolismo da superação das dificuldades. Vencer uma dificuldade sempre nos dá uma alegria secreta de ter superado um limite, porém para superá-la temos de conhecê-la. Muitas pessoas sofrem por se verem diante de obstáculos que consideram intransponíveis apenas por não conhecerem onde iniciam suas dificuldades.

Sentindo-se impotente diante da vida, seja por uma clara razão ou não, a pessoa tende a regredir na vida, entra em depressão e tem seu sistema imunológico fragilizado. São momentos difíceis, muitas vezes decisivos na vida da pessoa, que ela precisa de algo que traga um alívio. Muitas vezes, nessa busca desesperada de alívio, tende a procurar uma solução imediata que possa aliviar sua dor.

Alguns buscam o apoio da família, outros dos amigos, outros no trabalho, na religião, nas distrações e nas drogas, porém as causas sutís das dificuldades permanecem e voltarão a se intensificar cada vez de forma mais acentuada. Não identificando e não tomando nenhuma providência para saná-las, provocarão desgastes emocionais que terão reflexos diretamente no corpo físico, além de afetar os seus relacionamentos profissionais, pessoais e afetivos.

Ao utilizar paliativos, a pessoa consegue apenas alívio temporário. Apenas quando a pessoa reconhece que os paliativos não são suficientes, que antigos padrões não funcionam e que falta de consciência lhe deixa refém e dependente de outras pessoas, é que possibilitará a busca de antigas questões do passado que atuam no presente sob novas formas. Em alguns casos, é preciso ajuda profissional que possa facilitar essa descoberta. O autoconhecimento permite que a pessoa possa interpretar a si mesma e perceber que Aporia não é tão grande quanto parece.

http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/search/label/Mito%3A%20Aporia%20o%20daimon%20da%20dificuldade

Mulher dama.

MULHER DAMA
Charles Fonseca

Eu era quando a vi
Só folha na viração
Só seixo no aluvião
Ela hera a fingir

Uma paixão tresloucada
Um faz de conta a sorrir
Eu mais outro a carpir
Saudade do sonho nada.

Quando quebrei a redoma
Pus no chão em estilhaços
A imagem de palhaço
E a dela pois que não dama.

Chuvas de bênçãos. Hino.

81. «A Sagrada Escritura é a Palavra de Deus enquanto foi escrita por inspiração do Espírito divino».

«A sagrada Tradição, por sua vez, conserva a Palavra de Deus, confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos, e transmite-a integralmente aos seus sucessores, para que eles, com a luz do Espírito da verdade, fielmente a conservem, exponham e difundam na sua pregação» (47).

82. Daí resulta que a Igreja, a quem está confiada a transmissão e interpretação da Revelação, «não tira só da Sagrada Escritura a sua certeza a respeito de todas as coisas reveladas. Por isso, ambas devem ser recebidas e veneradas com igual espírito de piedade e reverência» (48).

Catecismo

Girassóis. Van Gogh.


segunda-feira, março 26, 2012

Apolo e Marpessa, aprendendo a perder. Mitologia.

Apolo e Marpessa, aprendendo a perder


No tempo em que os deuses do Olimpo ainda desciam à terra em busca do amor das belas mortais, Apolo tinha tudo para ser o mais cobiçado. Além de ser a divindidade responsável pela cura das doenças e dos ferimentos, Apolo também presidia tudo o que se referia à música, ao canto e à poesia, sempre na companhia das musas. Sua figura serena era a encarnação do equilíbrio harmonioso entre o intelecto e a beleza física. Os artistas sempre o representaram como um homem jovem, de porte atlético, com feições refinadas e um semblante inteligente - um verdadeiro modelo de beleza viril. Era difícil imaginar que alguma mulher, pudesse resistir a um homem assim.

Marpessa era uma princesa de extraordinária beleza e Apolo se apaixonou tanto por ela que, numa atitude sem precedentes, pediu-a em casamento. Porém Idas, um principe que era apenas um mortal, também tinha feito o seu pedido de casamento. Como era inevitável, os dois rivais se defrontaram. Apesar de desigual, a terrível luta chamou a atenção de Zeus que se viu obrigado a interferir na briga dos pretendentes. A princesa Marpessa foi incumbida de escolher com quem se casaria e surpreendentemente ela escolheu Idas.

Questionada porque teria rejeitado o deus Apolo, ela disse que não poderia ser feliz ao lado de um deus tão cobiçado e tão célebre em toda a Grécia, além de que temia ser abandonada pelo deus quando ficasse velha. Apolo retornou para o Olimpo, derrotado e inseguro, inaugurando o mote que os homens despeitados repetem até hoje quando se sentem preteridos ou trocados por alguém que consideram um rematado cretino: "É a velha queda que as mulheres têm pelos tolos!"

*******************

O mito de Marpessa e a rejeição de Apolo retrata aquelas mulheres que se casam com homens brilhantes e criativos mas que em alguns casos, são castigadas por sua ousadia. Ele quer ser sempre o grande vencedor e aos poucos, ela vai percebendo que viver ao lado dele é um presente magnífico mas que se deve pagar dia-a-dia com o próprio aniquilamento.

E quando uma mulher percebe a poderosa armadilha e a rejeita, o consolo do eterno ressentido é combater aquele que ocupa o lugar antes por ele pretendido. Assim, desfazem qualquer qualidade do seu rival devido à sua própria insegurança e pelo que consideram uma terrível derrota. O mito revela que as pessoas não são educadas para perder.

Geralmente os pais, logicamente com boas intenções, exaltam muito as vitórias e incentivam os filhos sempre para ganhar e ganhar. E nessa cena corriqueira e aparentemente inocente, esconde um dos grandes pecados da educação: incentivar a criança a sair-se sempre campeã não é uma boa maneira de prepará-la para o mundo. Educar também é preparar a criança para a vida, na qual enfrentará o doce sabor da vitória e o amargo sabor da derrota.

Ensinar à criança a perder é essencial para sua formação. Uma criança que não tem a oportunidade de sofrer uma derrota não vai saber lidar com as frustrações da vida, que sempre nos propicia momentos de altos e baixos. Perdemos a hora, perdemos o ônibus, perdemos um amor, perdemos um emprego. Tudo isso faz parte da nossa formação. Saber lidar com isso é o que faz a diferença. Num primeiro momento, é comum associar a derrota ao sentimento de fracasso. Porém, a dimensão que esse fato terá na vida dependerá da maneira como se administra a situação.

Perder será inevitável no jogo da vida, motivo mais que suficiente para que os pais auxiliem seus filhos, desde a infância, a administrarem os sentimentos esperados quando tal fato ocorre. Além disso, ao não sagrar-se vencedor, tem-se a oportunidade de descobrir outras maneiras de se satisfazer. Se não tiver limites, a criança não aprenderá a ser tolerante com os problemas que irá enfrentar na vida. É importante aprender que os jogos tem regras e saber superar a decepção.

Querer vencer é algo positivo que incentiva e funciona como um desafio para buscar sempre melhorar o desempenho. No entanto, é fundamental aprender a competir, valorizar a competição e não somente o resultado. Jogar e competir tem muitas vantagens e perder é inevitável. Os jogos são excelentes oportunidades de treinar essa desenvoltura. Exemplos são as competições esportivas, como o futebol, no qual apenas um time será o vencedor e isso não significa que esse resultado será para sempre.

Perder uma partida não é sinônimo de derrota, fracasso irreversível. O bom resultado de um campeonato também é fruto de algumas derrotas. Quando ocorre a perda é um ótimo momento para rever a jogada e aprender, melhorar e pensar sobre como alcançar uma vitória outro dia. E assim é em todas as competições, sejam esportivas, pessoais e profissionais. Competir não é só ganhar ou perder. Em uma disputa, muita coisa está em jogo: novas habilidades podem ser aprendidas, a criatividade pode ser melhor desenvolvida, a lembrança e o raciocínio sobre um erro pode evitar outros lances errados. Qualquer disputa se reverte sempre num aprendizado.

Na vida sempre encontramos alguém que irá nos frustar, nos decepcionar ou que irá nos negar o que queremos. Toda existência humana é marcada pela condição de contradição, ou seja, pela fraqueza e pela queda. Aceitar a própria condição limitada é sinal de sabedoria. Aprender que a queda, os fracassos e as perdas fazem parte da vida, é aprender a ter humildade para encarar a perda como uma possibilidade de superação e motivação para seguir em frente.

Quem é incentivado apenas a vencer, nunca conseguirá lidar com a frustração. Se sentirá inferior e culpado, carregando consigo o medo de decepcionar os outros e não ser amado e admirado, apenas porque não é um eterno vencedor. Quem aprende a vencer e perder, adquire autoconfiança, tem autoestima elevada, aprende a lidar com as frustrações e sabe que, vencendo ou perdendo, será sempre amado e estimado. Quem não sabe perder, tampouco saberá celebrar com sabedoria as suas vitórias...

http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/search/label/Mito%3A%20Apolo%20e%20Marpessa%20aprendendo%20a%20perder

Homem ao mar. Rubem Braga.

Homem no mar

Rubem Braga


De minha varanda vejo, entre árvores e telhados, o mar. Não há ninguém na praia, que resplende ao sol. O vento é nordeste, e vai tangendo, aqui e ali, no belo azul das águas, pequenas espumas que marcham alguns segundos e morrem, como bichos alegres e humildes; perto da terra a onda é verde.

Mas percebo um movimento em um ponto do mar; é um homem nadando. Ele nada a uma certa distância da praia, em braçadas pausadas e fortes; nada a favor das águas e do vento, e as pequenas espumas que nascem e somem parecem ir mais depressa do que ele. Justo: espumas são leves, não são feitas de nada, toda sua substância é água e vento e luz, e o homem tem sua carne, seus ossos, seu coração, todo seu corpo a transportar na água.

Ele usa os músculos com uma calma energia; avança. Certamente não suspeita de que um desconhecido o vê e o admira porque ele está nadando na praia deserta. Não sei de onde vem essa admiração, mas encontro nesse homem uma nobreza calma, sinto-me solidário com ele, acompanho o seu esforço solitário como se ele estivesse cumprindo uma bela missão. Já nadou em minha presença uns trezentos metros; antes, não sei; duas vezes o perdi de vista, quando ele passou atrás das árvores, mas esperei com toda confiança que reaparecesse sua cabeça, e o movimento alternado de seus braços. Mais uns cinqüenta metros, e o perderei de vista, pois um telhado a esconderá. Que ele nade bem esses cinqüenta ou sessenta metros; isto me parece importante; é preciso que conserve a mesma batida de sua braçada, e que eu o veja desaparecer assim como o vi aparecer, no mesmo rumo, no mesmo ritmo, forte, lento, sereno. Será perfeito; a imagem desse homem me faz bem.
É apenas a imagem de um homem, e eu não poderia saber sua idade, nem sua cor, nem os traços de sua cara. Estou solidário com ele, e espero que ele esteja comigo. Que ele atinja o telhado vermelho, e então eu poderei sair da varanda tranqüilo, pensando — "vi um homem sozinho, nadando no mar; quando o vi ele já estava nadando; acompanhei-o com atenção durante todo o tempo, e testemunho que ele nadou sempre com firmeza e correção; esperei que ele atingisse um telhado vermelho, e ele o atingiu".

Agora não sou mais responsável por ele; cumpri o meu dever, e ele cumpriu o seu. Admiro-o. Não consigo saber em que reside, para mim, a grandeza de sua tarefa; ele não estava fazendo nenhum gesto a favor de alguém, nem construindo algo de útil; mas certamente fazia uma coisa bela, e a fazia de um modo puro e viril.

Não desço para ir esperá-lo na praia e lhe apertar a mão; mas dou meu silencioso apoio, minha atenção e minha estima a esse desconhecido, a esse nobre animal, a esse homem, a esse correto irmão.

VIDEO COM IMAGENS DE LAMPIAO


ELA
Charles Fonseca

Agora tenho namorada
Terna, doce e pequenina
Da meia idade e é menina
Sem vaidade, me quer, mais nada.

Olha-me terna, eu já sofrido
Longa foi minha caminhada
Gosto dela, outra jornada
Almejo ter. Ela comigo.

Firme nas promessas. Hino.

Clique: http://www.youtube.com/watch?v=WHImeqHb6I4&list=PL0D30C827629062EC&index=101&feature=plpp_video
80. «A Tradição sagrada e a Sagrada Escritura estão intimamente unidas e compenetradas entre si. Com efeito, derivando ambas da mesma fonte divina, fazem como que uma coisa só e tendem ao mesmo fim» 16. Uma e outra tornam presente e fecundo na Igreja o mistério de Cristo, que prometeu estar com os seus, «sempre, até ao fim do mundo» (Mt 28, 20).
Catecismo

Voo de uma Abelha por Salvador Dali


Dilma, Assista Já o Filme "A Dama de Ferro"

Cliquehttp://blog.kanitz.com.br/2012/03/dilma-assista-j%C3%A1-o-filme-a-dama-de-ferro.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+stephen_kanitz+%28Stephen+Kanitz+the+blog%29

Arnolfini casamento por Jan van Eyck


domingo, março 25, 2012

Carnival In Rio 1955

Cliquehttp://youtu.be/Xmmel1WrXXE

Castelo de Santo Ângelo. Roma


Uma Mulher Chamada Guitarra. Vinicius de Moraes.

Uma Mulher Chamada Guitarra

Vinicius de Moraes


UM DIA, casualmente, eu disse a um amigo que a guitarra, ou violão, era "a música em forma de mulher". A frase o encantou e ele a andou espalhando como se ela constituísse o que os franceses chamam um mot d'esprit. Pesa-me ponderar que ela não quer ser nada disso; é, melhor, a pura verdade dos fatos.

0 violão é não só a música (com todas as suas possibilidades orquestrais latentes) em forma de mulher, como, de todos os instrumentos musicais que se inspiram na forma feminina — viola, violino, bandolim, violoncelo, contrabaixo — o único que representa a mulher ideal: nem grande, nem pequena; de pescoço alongado, ombros redondos e suaves, cintura fina e ancas plenas; cultivada, mas sem jactância; relutante em exibir-se, a não ser pela mão daquele a quem ama; atenta e obediente ao seu amado, mas sem perda de caráter e dignidade; e, na intimidade, terna, sábia e apaixonada. Há mulheres-violino, mulheres-violoncelo e até mulheres-contrabaixo.

Mas como recusam-se a estabelecer aquela íntima relação que o violão oferece; como negam-se a se deixar cantar, preferindo tornar-se objeto de solos ou partes orquestrais; como respondem mal ao contato dos dedos para se deixar vibrar, em benefício de agentes excitantes como arcos e palhetas, serão sempre preteridas, no final, pelas mulheres-violão, que um homem pode, sempre que quer, ter carinhosamente em seus braços e com ela passar horas de maravilhoso isolamento, sem necessidade, seja de tê-la em posições pouco cristãs, como acontece com os violoncelos, seja de estar obrigatoriamente de pé diante delas, como se dá com os contrabaixos.

Mesmo uma mulher-bandolim (vale dizer: um bandolim), se não encontrar um Jacob pela frente, está roubada. Sua voz é por demais estrídula para que se a suporte além de meia hora. E é nisso que a guitarra, ou violão (vale dizer: a mulher-violão), leva todas as vantagens. Nas mãos de um Segovia, de um Barrios, de um Sanz de la Mazza, de um Bonfá, de um Baden Powell, pode brilhar tão bem em sociedade quanto um violino nas mãos de um Oistrakh ou um violoncelo nas mãos de um Casals. Enquanto que aqueles instrumentos dificilmente poderão atingir a pungência ou a bossa peculiares que um violão pode ter, quer tocado canhestramente por um Jayme Ovalle ou um Manuel Bandeira, quer "passado na cara" por um João Gilberto ou mesmo o crioulo Zé-com-Fome, da Favela do Esqueleto.

Divino, delicioso instrumento que se casa tão bem com o amor e tudo o que, nos instantes mais belos da natureza, induz ao maravilhoso abandono! E não é à toa que um dos seus mais antigos ascendentes se chama viola d'amore, como a prenunciar o doce fenômeno de tantos corações diariamente feridos pelo melodioso acento de suas cordas... Até na maneira de ser tocado — contra o peito — lembra a mulher que se aninha nos braços do seu amado e, sem dizer-lhe nada, parece suplicar com beijos e carinhos que ele a tome toda, faça-a vibrar no mais fundo de si mesma, e a ame acima de tudo, pois do contrário ela não poderá ser nunca totalmente sua.

Ponha-se num céu alto uma Lua tranqüila. Pede ela um contrabaixo? Nunca! Um violoncelo? Talvez, mas só se por trás dele houvesse um Casals. Um bandolim? Nem por sombra! Um bandolim, com seus tremolos, lhe perturbaria o luminoso êxtase. E o que pede então (direis) uma Lua tranqüila num céu alto? E eu vos responderei; um violão. Pois dentre os instrumentos musicais criados pela mão do homem, só o violão é capaz de ouvir e de entender a Lua.

Ciprestes. Van Gogh.


O plantador de quiabos. Cinema.

Cliquehttp://www.portacurtas.com.br/beta/Default.aspx

Três quartos

TRÊS QUARTOS
Charles Fonseca

Foi-se de mim três quartos do afeto
Durmo sozinho em dois quartos, com efeito
Resta um quarto, três quartos é defeito?
Quero um meio de tê-la num quarto

Pouco é o que quero, não quero só um quarto
Quero a metade só ela completa
Ela, incerta, não quer um poeta
Confesso, por ela mudo de quarto.

O nascimento de Vênus.


79. Assim, a comunicação que o Pai fez de Si próprio, pelo seu Verbo, no Espírito Santo, continua presente e activa na Igreja: «Deus, que outrora falou, dialoga sem interrupção com a esposa do seu amado Filho; e o Espírito Santo – por quem ressoa a voz do Evangelho na Igreja, e, pela Igreja, no mundo – introduz os crentes na verdade plena e faz com que a palavra de Cristo neles habite em toda a sua riqueza» (45)
Catecismo

sábado, março 24, 2012

A surdez de Beethoven

A SURDEZ DE BEETHOVEN
Luiz Fernando Pinto


As cordas das harpas
Transformaram-se em cabelos de Medusa,
Quando, em desespero,
As violas, os violinos e os violoncelos
Receberam dos instrumentos de sopro e percussão
A angustiante missão
De comunicar a Beethoven
A fatalidade da sua surdez.


Inconformadas com a desdita do Mestre,
De repente,
As harpas transformaram-se
Em medusas enlouquecidas,
E devoraram todas as claves de sol,
Todos os tons sustenidos,
E todas as colcheias e semicolcheias,
Emudecendo, assim, a orquestra
Que Beethoven continuava a reger
- de olhos fechados e quase em transe -
Sem se dar conta do silêncio
De respeito e de tristeza
Que dolorosamente
Emudecera os seus músicos
E a voz dos seus instrumentos.


Em desespero, as pautas das partituras
Transformaram-se num insólito mausoléu,
Que aprisionou, silenciosamente,
A surdez de Beethoven
Que palpitava dolorosamente
No coração emocionado
De todos os presentes,
Naquela platéia amargurada!...

Canto do povo de um lugar. Caetano Veloso.

Canto do povo de um lugar.
Caetano Veloso.

Todo dia o sol levanta
E a gente canta
Ao sol de todo dia
Fim da tarde a terra cora
E a gente chora
Porque finda a tarde
Quando a noite a lua mansa
E a gente dança
Venerando a noite

A criação de Adão. Michelangelo.


Nem com uma flor. Affonso Romano de Sant'Anna

Nem com uma flor

Affonso Romano de Sant'Anna

"Até hoje só bati numa mulher,
mas com singular delicadeza"
Vinicius de Moraes


Um amigo ia passando pela Avenida Atlântica quando viu um homem batendo numa mulher dentro de um carro estacionado. Resolveu parar e chamar a polícia. Mas iam passando pelo calçadão dois garotões atléticos que vendo o tumulto pararam também para saber. Meu amigo então lhes explica que o sujeito estava batendo na mulher.

— Mas a mulher não é dele? - indagou o garotão.

— E só porque é dele pode bater? - diz o amigo.

— É, nessa você me pegou, cara.

Nesta semana a OAB descobriu que em Imperatriz, no Maranhão, nos últimos cinco anos, maridos mataram 30 mulheres. Mas o fizeram por uma razão muito clara: não queriam pagar pensão nem partilhar os bens na separação. Diante desta estatística da terra de Sarney, os machos da terra de Tancredo ficam humilhados, porque eles só matam mulher por "traição", e, mesmo assim, em menor escala.

Mas vou lhes contar outra estória: uma amiga estava em São Paulo numa conversa sobre espancamento de mulheres. De repente, falou-se de um conhecido professor que havia espancado a mulher (coisa, aliás, que acontece em várias faculdades do país). Reparem bem, estamos falando de gente fina. Não se trata de cachaceiros na subida do morro, do sujeito massacrado pela vida que chega em casa escorraçando as crianças, cães e mulheres. Estamos falando de gente inteligente, formada, com anel no dedo, que toma coquetéis com a gente e cita Marx, Hegel et caterva. Vai daí, alguém, comentando a razão por que o professor teria batido na mulher, sendo ele uma pessoa célebre, indaga: - Mas, afinal, ele é ele, e ela quem é?

Na primeira estorinha vocês viram que um acha que a mulher é propriedade privada do marido, e por isto pode apanhar. Quer dizer: é igual quando a gente tem um cavalo ou cão. Já na segunda narrativa, a titulação acadêmica ou a importância hierárquica justifica a violência sobre o mais fraco. E a mulher, do ponto de vista muscular, é geralmente mais fraca que o homem. Por isto faz muito sentido quando na favela ao lado ouço as mulheres que apanham gritar: "Covarde! Vai bater num homem". E um garotão esclarecido, que estuda lutas marciais, ao ouvir a estória do professor espancador, observou: "Eu queria ver esse professor crescer para cima de mim".

As estorinhas como essas são intermináveis. Lá vai outra. Uma amiga estava dando uma entrevista à televisão e o assunto era exatamente o espancamento de mulheres e a necessidade de se criar uma delegacia especial no Rio, como Franco Montoro criou em São Paulo, só para atender mulheres. E lá ia explicando o bê-á-bá da violência dos homens sobre as mulheres, lembrando que, quando uma mulher é violentada ou espancada, nas delegacias comuns têm que passar por vexames e cantadas, que os homens vêem a vítima como culpada, porque nossa sociedade nos convenceu de que a mulher é sempre uma Eva pecadora. Lembrava que em alguns países, além das delegacias para mulheres, há associações estruturadas para esconderem as vítimas, porque sabem que se muitas delas voltarem para casa serão até assassinadas. E foi explicando que em alguns lugares dos Estados Unidos existe um tratamento para maridos violentos, em sessões comuns, uma espécie de Associação de Alcoólatras Anônimos (os Espancadores Anônimos), que se curam e se tratam em grupo, porque isto é uma doença pessoal e social.

Mas enquanto minha amiga dava a entrevista, os câmeras estavam indóceis. Parecia que o assunto era com eles. E aí, não agüentaram, interromperam a entrevista e um disse: — a gente trabalha na rua o dia inteiro, chega em casa cansado e a comida não está pronta, o que é que há? Ela está querendo apanhar! E a amiga tentou explicar: — então é só você que trabalhou? Ela não batalhou por aí em dupla jornada? Imagine se toda mulher fosse bater em marido que traz pouco ou nenhum dinheiro para casa?

Os câmeras continuaram resmungando durante a entrevista. Não sei o que aconteceu quando eles chegaram em casa. Mas se houvesse na cidade uma delegacia para defender o direito das mulheres certamente pensariam duas vezes. Talvez não chegassem em casa sobraçando flores. Mas seguramente chegariam menos arrogantes.

(27.10.85)

Apolo, deus da luz física e espiritual. Mitologia.

Apolo, deus da luz física e espiritual


Apolo foi uma das principais divindades da mitologia greco-romana, e um dos principais deuses olimpicos. Filho de Zeus e da titanide Leto, irmão gêmeo de Ártemis, possuia muitos atributos e funções. Depois de Zeus, era o mais influente e venerado de todos os deuses da Antiguidade Clássica. Apolo teve um grande número de amores, masculinos e femininos, mortais e imortais, tendo sido rejeitado por alguns ou alguma tragédia interrompia o romance.

Apolo era sinônimo de luz física e espiritual. Era tido como eternamente jovem e de beleza sem igual entre os Deuses. Apolo era o mais belo dos deuses, senhor das artes, música e medicina. Exímio arqueiro e com tantos predicados, Apolo acreditava que suas flechas fossem mais poderosas que as flechas do Cúpido, porém o Cúpido lhe advertiu, que as flechas de Apolo poderiam ferir, porém suas flechas tinham uma força poderosa.

Para provar seu poder, o Cúpido disparou uma flecha de ouro no coração de Apolo e ele se tornou perdidamente apaixonado pela ninfa Dafne; mas no coração de Dafne o Cúpido disparou uma flecha de chumbo; isto fêz com que Dafne rejeitasse Apolo, embora ele sempre a perseguisse.

Dafne era filha do Deus Rio Peneu e pediu ao pai que a ajudasse a se livrar de Apolo. Atendendo ao pedido, Peneu transformou a filha em uma planta, o loureiro. Inconformado com a perda da amada, Apolo passou a usar uma coroa com as folhas de louro, que se tornou seu símbolo para sempre e passou a ser oferecida aos vencedores dos jogos.

Hermes era seu irmão, filho de Zeus e da ninfa Maia, uma das Pleiades. Hermes e Apolo disputaram o amor de Quione, por sua grande beleza. Temeroso que Apolo a ganhasse, Hermes tocou seus lábios de Quione com o caduceu, a fêz dormir e a possuiu. Não obstante, Apolo, disfarçado de uma velha, penetrou no quarto de Quione e a amou também.

Dessas uniões, Quione concebeu Autólico, filho de Hermes; e Filamon, filho de Apolo. Porém Quione se sentiu mais bela que Ártemis, deusa da vida selvagem e da caça, e era írmã gêmea de Apolo. Injuriada, Ártemis a matou. O pai de Quione, tomado pela dor, jogou-se de um penhasco, mas Apolo o transformou em uma águia feroz.

Apolo gerou com Corônis o filho Asclépio, que se tornou um mestre na arte de curar e ressuscitar os mortos. Com isso, Asclépio ameaçava o poder soberano de Zeus, e causava insatisfação em outros deuses, pois os mortos nas guerras sempre retornavam, roubando os súditos de Hades. Por isso, Asclépio foi morto pelo raio de Zeus. Para vingar-se de Zeus, como não podia voltar-se contra seu pai, Apolo matou os Cíclopes, que haviam forjado os raios, e por isso foi castigado.

Apolo foi condenado a um ano de trabalhos forçados junto ao rei mortal Admeto. Sendo bem tratado pelo rei durante sua expiação, Apolo ajudou-o a obter Alceste e a ter uma vida mais longa a que o destino lhe reservara. Além disso, ensinava a música, a dança, as artes e ofícios, os jogos atléticos, a caça e a percepção da natureza e da própria beleza aos mortais. Os deuses vendo que Apolo tornava muito aprazível a vida dos mortais, resolveram levar Apolo novamente ao Olimpo.

Retornando, Apolo se apaixonou pela princesa troiana Cassandra e a presenteou com o dom da profecia. Mas Cassandra o repudiou e Apolo a puniu fazendo com que ninguém acreditasse nela, embora suas profecias se revelassem sempre verdadeiras posteriormente.

Hermes, seu irmão por parte de Zeus, roubou-lhe o gado. Apolo o acusou mas vendo Hermes tocar uma lira, ficou encantado e trocou o gado pela lira. Mais tarde Hermes inventou uma flauta, que Apolo também desejou para si, mas em troca Hermes exigiu que seu irmão lhe ensinasse a arte da profecia. Apolo concordou, e deu ainda para Hermes seu cajado de pastor, que se transformou no caduceu hermético.

Após esse episódio, Apolo se apegou ao jovem Jacinto, que o acompanhava em todas as atividades físicas, negligenciando suas flechas e liras por causa de Jacinto. Certa vez Apolo e Jacinto estavam a lançar discos, e Apolo lançou o primeiro com muita força e precisão, tipicamente de um deus. Jacinto correu para alcançar o disco. Porém, Zéfiro - o Vento Oeste - que fora rejeitado por Jacinto, soprou o disco em direção a Jacinto, que veio a atingir sua cabeça.

Apolo correu para tentar ajudar seu amigo, mas percebeu que ele tinha morrido. Declarando seu amor a Jacinto, e inconformado com a perda, as musas sentiram pena de Apolo e fizeram que do sangue de Jacinto, surgisse uma bela flor, o Jacinto.

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Jade. João Bosco. Música.

Clique: http://www.youtube.com/watch?v=f4WxPkc-SCk&list=PL0D30C827629062EC&index=12&feature=plpp_video

QUANDO O AMOR VAI EMBORA. Charles Fonseca. Poesia.

QUANDO O AMOR VAI EMBORA
Charles Fonseca

Quando ela foi embora
Fiquei só com a minha dor
Quero achar um novo amor
Neste impuro mundo afora

Oh, silêncio que me mata
Oh, não dito que devora
Oh, descrença que me arvora
Matastes um amor sem jaça

Oh, tempo cobre em poeira
Cobre a dor de uma amizade
Trincada pra sempre, apague,
Este amar por vez primeira!

A ponte japonesa. Monet.


78. Esta transmissão viva, realizada no Espírito Santo, denomina-se Tradição, enquanto distinta da Sagrada Escritura, embora estreitamente a ela ligada. Pela Tradição, «a Igreja, na sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo aquilo que ela é e tudo em que acredita» (43). «Afirmações dos santos Padres testemunham a presença vivificadora desta Tradição, cujas riquezas entram na prática e na vida da Igreja crente e orante» (44).
Catecismo

Mais perto quero estar. Hino.

Clique: http://www.youtube.com/watch?v=_FH869hZKxQ&list=PL0D30C827629062EC&index=99&feature=plpp_video

sexta-feira, março 23, 2012

Poema sentido.

POEMA SENTIDO
Charles Fonseca

Ele é um voador
Vive ele em fantasia
O néscio o arrelia
O sábio ilustra a dor

De jovem, meio inocente,
Por um lado cerceado
Por outro ele é minado
Sua alma está doente

Uns falseiam a verdade
Outros arrotam desprezo
O próprio mesmo é um preso
Da censura, sua herdade,

Oh Deus! tanto grilhão
Em terra do homem mau
No mar bote sem nau
Dá a ele luz quinhão

Enquanto há esperança
Tu que era e és antes
Da matéria, és o instante
Imóvel , move a criança

Que sacoleja e é carente
Rasteja não sendo réptil
Se voa é folha séssil
Tão à toa e só se sente.

David Garrett - Serenade ( Schubert )

Clique: http://youtu.be/SJ_kNFfBBcc

O troco. Cinema.

Clique: http://www.youtube.com/watch?v=a7R3IE6wOIo

Antígona e Creonte, aprendendo com a experiência. Mitologia.

Antígona e Creonte, aprendendo com a experiência


Antígona era uma das filhas do Rei Édipo de Tebas, nascida da sinistra e trágica união entre Édipo e sua mãe Jokasta. Apesar de sua origem sombria, Antígona tinha um caráter leal e amoroso. Quando ocorreu a derradeira expulsão de Édipo do reino de Tebas, cego e perseguido pelas fúrias, Antígona guiou seu pai durante os anos em que ele vagou por várias terras.

Os irmãos de Antígona, Polinices e Etéocles, foram eleitos para reinar alternadamente, mas após o primeiro ano de reinado Etéocles se recusou a passar o reinado ao seu irmão além de expulsá-lo da cidade. Entrando em confronto direto, Polinices e Etéocles feriram-se mutuamente e morreram. Seu tio Creonte, irmão de Jokasta, assumiu o trono declarando-se Rei de Tebas e assegurou o sepultamento de Etéocles conforme os costumes da cidade. No entanto, proibiu que Polinices fosse sepultado, já que havia a crença de que sua sombra permaneceria vagando às margens do Rio Estige.

O adivinho Tiorésias tentou convencê-lo a revogar sua decisão, mas Creonte se mostrou irredutível. As ordens do rei não deveriam ser desobedecidas e quem ousasse fazê-lo seria enterrado vivo. Porém Antígona desejava uma cerimônia de sepultamento para seu irmão Polinices porque compreendia os motivos que o haviam levado a Tebas. Antígona mandou construir uma pira e sobre ela colocou o corpo de Polinices seguindo o ritual para libertar a alma do irmão. Quando o Rei Creonte viu as chamas da pira, surpreendeu Antígona e a condenou a ser enterrada viva.

Antígona era noiva de Hemon, filho de Creonte, mesmo assim o rei o incumbiu da execução de Antígona. Fingindo estar de acordo, Hemon casou-se em segredo com Antígona e a levou para viver com os pastores. Quando Creonte descobriu, condenou o filho à morte.

Após a execução Creonte lamentou as irrefletidas decisões que havia tomado. Algum tempo depois, nasceu o filho de Antígona. Arrependido, o Rei de Tebas mandou chamar Antígona com seu neto para viver no reino. Finalmente Creonte havia reconhecido que as uniões familiares deveriam estar acima de qualquer poder, pois são elas que nos ajudam a suportar e resistir a todos os intempéries da vida, para fugir das tragédias cotidianas.

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O mito de Antígona é um dos mais expressivos e importantes da mitologia grega, pois há muitas inferências sutís no mito além da grande lealdade de Antígona com seu irmão. Ao abordar os mitos é preciso usar a Hyponoia, uma técnica hermenêutica que nos permite descobrir nos textos os vários sentidos ocultos, aparentemente menos relevantes.

Etimologicamente, Antígona significa: aquela que se coloca adiante de sua família ou do meio em que vive (anti = diante de + goné = nascimento ou origem). Com sua altivez e autoconfiança, Antígona mostrou os acentuados traços de insubmissão ao colocar-se acima das leis terrenas. Certa de sua posição de defensora das leis divinas, que eram anteriores às leis criadas na terra, Antígona foi inábil ao defendê-las tornando-se um obstáculo e um desafio perigoso para Creonte, pois poderia fazê-lo perder o controle da situação política de Tebas.

Havia uma grande diferença nas origens de Antígona e Creonte. Antígona era da raça de Lábdaco, de Laio e de Édipo, uma descendente dos Labdácidas, portanto, uma linhagem real orgulhosa e maldita, marcada por taras, anomalias e miasmas. Creonte, ao contrário, provinha de uma família socialmente inferior. Kreon, em grego, lembra soberania e poder - aquele que se identifica com o poder; Creonte era um burocrata apegado ao poder. Oscilando entre a fraqueza e o oportunismo, por sua linhagem ele estava fora da realeza e era apenas um funcionário qualificado no poder a reger problemas políticos.

O mito retrata as normas e leis sociais a que estamos submetidos nos colocando em um real dilema moral: devemos ser leais às nossas tradições culturais e familiares ou devemos nos submeter ao julgamento das normas sociais? O mito retrata ainda dois princípios: o princípio masculino relacionado autoridade, obediência, hierarquia e o princípio feminino, o mais fundamental e indestrutível de todos os vínculos, a lei da consanguinidade, da família, da irmandade, regidas pelas deusas do feminino.

Uma alegoria do mito mostra a supremacia da ordem masculina que tenta enterrar definitivamente os valores femininos, não reconhecendo os direitos naturais. Esse é um paradigma cultural anunciado na tragédia de Sófocles e que perdura ainda até os nossos tempos, revelando a supremacia das virtudes femininas: maternidade, amor, fraternidade, igualdade, a predominância dos valores tribais sobre os individuais.

Antígona representa o respeito pela vida humana, a igualdade e o amor entre todos os seres humanos. Creonte representa a supremacia do Estado e suas leis, a obediência à sua autoridade acima do direito natural da humanidade e acima da precedência dos laços familiares. Representa ainda os males da falsa autoridade e da crueldade gratuita suportadas apenas por normais sociais que refletem os valores e ambições pessoais de quem as cria, que não permite serem questionadas e são sustentadas apenas pelo poder no mundo externo. Tido como um comportamento socialmente correto, mais tarde pode ter de ceder lugar a uma interpretação diferente.

O matriarcado é universalista; o patriarcado impõe fronteiras, muros, separações. A família matriarcal é aberta e receptiva; a patriarcal é fechada e individualizada. Numa predomina o caos, a liberdade, a natureza; na outra, a limitação, a hierarquia, a ordem, o logos. Vencida a mulher, o patriarcado poderia se impor socialmente.

Édipo se automutilou, cegando-se para não ver todos os fatos expostos. Seu gesto de desespero representa a recusa em ver o que fizera. A cegueira vaidosa ainda acompanha o homem moderno que busca ver o mundo através do aparente. Confunde o real com o concreto, o verdadeiro com o lógico. Continua preso à grande ilusão de ter que ver para crer, não percebendo que grande parte do que é real nós não vemos, é invisível aos olhos e por isso é preciso ir além dos sentidos e da mente.

A Casa Real de Tebas tinha um passado sombrio que iniciou mesmo antes de Édipo. A família foi atormentada por várias maldições, simbolizando a família disfuncional e desestruturada. No entanto, Antígona conseguiu resistir. Com seu poder de amar foi capaz de vencer uma herança psicológica de destrutividade; ela redimiu o passado e conseguiu escrever um novo futuro aos seus descendentes.

Tirésias representa a sabedoria, que pressupõe experiência. Com sua sabedoria reforçou a reflexão, sempre necessária para qualquer decisão. Creonte defrontava-se com um conflito moral duplo: o conflito entre duas leis as quais devia lealdade, a reflexão e ação. Ele não se fechou a voz da razão, reconheceu seu erro e procurou corrigí-lo, lamentavelmente era tarde demais.

O arrependimento de Creonte está em reconhecer o completo colapso de seu mundo e a derrota de seus princípios. Creonte se transforma em vitima de sua própria justiça, homem sem lei e convicção. Onde havia orgulho, sobrou humildade; onde havia certeza, restaram dúvidas. O saber e a reflexão teórica sobre um conflito moral são insuficientes no momento da prática, ou seja, da opção por uma ou outra alternativa de ação, em favor de uma lei.

O drama de Creonte consistiu no fato de que sabedoria por si só não o protegeu do erro. Ao agir precipitadamente, condenou não só a outros, mas condenou a si mesmo. Faltou-lhe prudência, ou seja, experiência de vida associada a sabedoria. Creonte foi vitima da falta de prudência, agiu e errou, por isso sofreu as consequências de sua ação e adquiriu dolorosamente a experiência.

Apesar da lei da Polis lhe dar razão, procurou uma solução mediadora para corrigir seu extremismo fazendo valer a temperança. Creonte transformou-se, enquanto agia, num homem sábio e prudente. O tirano abatido e amargurado, derrotado pelo destino, agora é homem moralmente competente por ter adquirido prudência e temperança, produtos da experiência de vida, consequência de ação.

Nesse sentido, podemos entender que ambos aprenderam à lição. Ainda que tenham trilhado o caminho da frustração e da dor, aprenderam que é preciso ser prudente e agir com temperança, procurando aquele ideal de virtude que consiste no justo meio, sem radicalismos e polaridades extremistas. Todo o contexto dessa obra retrata o início da democracia na vida cotidiana dos gregos e o fim das tiranias. O homem passa a contrapor os seus ideais aos ideais dos deuses, pensando no seu agir e as consequências de suas ações em sua vida prática.

http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/search/label/Mito%3A%20Ant%C3%ADgona%20e%20Creonte%20aprendendo%20com%20a%20experi%C3%AAncia

Almoço na relva. Claude Monet.


Brincando de doutor. João Ubaldo Ribeiro.

Brincando de doutor

João Ubaldo Ribeiro


Foi minha mãe quem me deu o estojo de médico. Tinha um estetoscópio, um esfignomanômetro, uma seringa de injeção, uma daquelas lâmpadas de amarrar na cabeça que eu nunca usei, um termômetro e mais uns quatro ou cinco aparelhos, para cuja aplicação eu sempre pedia a minhas clientes que tirassem as calças. Interessante que minha mãe nunca tivesse cogitado das possibilidades de um estojo de médico. É claro que ela não sabia que a maior parte de minhas brincadeiras era de safadeza. Quem começou com este negócio não fui nem eu, foi uma vizinha, quando nós resolvemos brincar de esconder. Nós dois estávamos abaixados no socavão e aí ela passou a mão aqui por debaixo. Desse dia em diante, todo brinquedo meu passou a ser de safadeza e a melhor coisa que eu dizia era que todo mundo tinha de ver o negócio de todo mundo, assim: se você me mostrar o seu negócio, eu lhe mostro o meu negócio. Foi nessa época que eu descobri que a melhor coisa é ser especialista. Se você é generalista, pode ficar um pouco chato pedir à cliente que mostre o negócio. Se você é especialista, ela espera isso. Mas eu era muito burro e muito ignorante, nessa ocasião, para perceber essas vantagens. Não sei se você se lembra como eram as coisas em Aracaju, naquela época.

Não sei nem se você se lembra que nós dois ficávamos conversando a respeito de meu pai e minha mãe não serem mais nem meu pai nem minha mãe e você dizendo a mesma coisa. Não sei se você se lembra que todos os dois fomos ver o negócio de Suzana e, quando ela foi mostrar à gente, sentada na escada, fungando e usando umas calçolas de cadarço, a gente olhou mas ficou com vergonha de ter olhado e você disse: bem que minha mãe falou, essa coisa suja, essa coisa imunda — você se lembra que eu peguei e ela deu risada se sacudindo toda? Você ficava falando, depois da aula de catecismo: se tem que feder assim, o melhor mesmo é ser padre. O pior das coisas das meninas, segundo Dodô, era quase que eram compostas de pelancas e coisas pendurantes e ainda exalavam, não eram uns buracos, que a gente pudesse ver que era somente um buraco e não ter complicação. Dodô dava explicações: o buraco da mulher fica no meio das pernas, por debaixo, e ela só dá para quem quer, a não ser com porrada e olhe lá.

Dodô, aliás, quero que você se lembre da importância de Dodô para toda essa transação. Ia perguntar se você se lembrava das palestras de Dodô, quando ele fazia conferências para nós todos. Foi Dodô quem primeiro explicou — você tem visto Dodô? você acha que ele pode ter melhorado da escoliose? melhorou nada, aquele anão — que o menino é feito por via de o pai enfiar-se pela mãe. Isso tudo era muito chocante. Traz à memória um colega patologista amigo meu, que era patologista porque só gostava de cadáver, que olhou os espermatozóides no microscópio e disse: meu pai nunca vai acreditar nisto, ele pode ver à vontade que não acredita. E minha mãe nem consentiria em olhar no microscópio, quanto mais. Você sabe, disse esse patologista, eu vejo aqui os espermatozóides, vejo tudo o que li nos livros, mas não acredito que foi assim? Não acredito, diz esse patologista, que meu pai e minha mãe tenham ido para a cama dessa maneira. Eu devo ter sido geração espontânea.

Era a mesma coisa que no tempo de Dodô, a gente também não acreditava. Inclusive, Dodô explicava que os meninos feios vêm do fato de que, na hora de fazer esses filhos, o pai contorce a cara toda. Para fazer um menino bonito, esclarecia Dodô, é preciso que o sujeito fique com a cara bem ancha e descansada. E ele fazia uma cara dessas, para dar o exemplo. Entretanto, acrescentava que pouca gente resiste ao gozo e então faz caretas as mais medonhas. Eu mesmo, quando trepo, dizia Dodô, faço cada careta que às vezes a mulher tem medo. E a gente ficava acreditando que Dodô trepava mesmo e todos nós queríamos saber como era o gozo. O gozo, mestre, vai repuxando, repuxando — explicava Dodô — e a pessoa faz assim: ssfff, sssfff, inclusive você conhece se a mulher está gozando vendo se ela faz ssfff ou não.

Quando meu estojo de médico chegou, eu já dava algumas consultas, mas tudo muito empírico. A maioria das meninas exigia uma certa respeitabilidade, de forma que ficava difícil fazer com que elas tirassem as calças, se tudo o que você tinha era um pedaço de pau e umas folhas para servirem de instrumentos. Além de tudo, de vez em quando eu passava esse pedaço de pau com força nas barrigas das meninas e elas não gostavam. Hoje eu sei que devia ser vontade de fazer uma histerectomia, dessas radicais. Eu tenho um amigo que já fez não sei quantas, estudou comigo na Bahia. Ele diz que não, mas eu tenho certeza de que ele adora fazer uma histerectomia, eu compreendo. Eu não faço, mas compreendo. Você acredita que eu assisti a uma laparoscopia e fiquei excitadíssimo? Eu acho ovário uma coisa linda, parece uma flor, uma espécie de tulipa, você não acha?

No começo, o consultório correu ótimo. Instalei tudo num dos dois quartos vazios do quintal e passava lá as tardes inteiras. O primeiro instrumento que eu aplicava era o estetoscópio, mas não havia graça, porque a maioria das meninas não tinha peito. O único peito que a gente via naquela época era naqueles quadros renascentistas que as revistas publicavam no Natal e, assim mesmo, só servia para a gente achar que ia para o inferno, porque a gente pensava que aquelas madonas eram mesmo Nossa Senhora. Só houve uma menina em que os peitos faziam diferença, porque os dela já tinham aquele carocinho. Eu belisquei e ela fez xixi nas calças. Eu brinco com o pessoal lá no Centro, digo que deve ser por isso que até hoje não posso ver um penico que não pense descaração. Brincadeira, brincadeira, mas você sabe que de fato existe alguma coisa num penico... bem, não sei. A maioria das casas, naquela época, tinha penico e uma das coisas mais dantescas, durante a noite, eram os adultos mijando nos penicos, lembro que minha avó mijava muito, eu ficava arrepiado e sentia uns pingos de mijo na cara, uma coisa horrível. Meu pai mijava em pé, fazendo pontaria no penico, e bodosava tudo em redor. Uma vez, ele me pegou mijando abaixado e me esculhambou. Você se lembra que o sujeito que mijava abaixado estava desmoralizado, mesmo que fosse para não regar o quarto todo? Até hoje o velho fala nisso, geralmente quando tem visita de Aracaju.

Então meu consultório corria bem. Normalmente, eu só dava consulta às meninas, mas, quando não havia clientes à disposição, nós fazíamos outras coisas. Jofre, por exemplo, que morava na rua do Cedro, trouxe uma vez um gato para nós operarmos. Para ele operar. Na época eu não sabia disso, mas eu era o clínico e ele era o cirurgião. Em matéria de cirurgia, até hoje eu prefiro assistir, principalmente quando há uma extirpação. Não sei se você já fez uma vivissecção de ovos de gatos. Jofre era muito bom nisso. Usava uma gilete e cortou os quibas do gato mais do que rente, um trabalho perfeito. Mas a gente se recusava a simplesmente capar o gato, de forma que havia várias solenidades, nós chamávamos o gato de cliente e tudo mais. Acabamos de cortar os ovos do gato e ficamos excitadíssimos. Perguntei a Jofre se aquilo era o gozo, mas ele disse que não era. De qualquer maneira, não deixou de ser uma lição o fato de que esse gato não ficou aborrecido com a operação e sempre voltava, a gente pegava nele com a maior facilidade. Quando a gente pegava, dava uma lavagem nele, com minha seringa de injeção, que tinha uma agulha rombuda de plástico. Sempre cito isso para esses caras que fazem psicanálise com esquizofrênicos, para mim os malucos são eles. Eu acredito em bolinha, sempre acreditei em bolinha — me dê um maluco, eu lhe dou uma bolinha, é tudo um problema químico. A verdade é que este é um campo que comporta muita besteirada.

A maioria das meninas cooperava perfeitamente. Eu sempre receitava uma injeção nas náguinas — eu dizia náguinas e até hoje acho mais bonitinho do que nádegas — e elas deixavam. Lembro perfeitamente que, quando eu descobria certas bundinhas, era uma sensação um pouco desconfortável, porque eu ficava trêmulo e não sabia distinguir entre os não sei quantos impulsos de me mexer que sentia, para a frente, para trás, para os lados, uma coisa horrível. Também ficava sem fôlego. Mas, depois da injeção nas náguinas, eu sempre reunia coragem para fazer uma espécie de exame ginecológico. Você sabe, até hoje eu não entendo como o sujeito pode ser ginecologista. Existe vocação para tudo neste mundo. É por isso que eu acredito na utilidade das perversões. Sem pervertidos, não haveria ginecologistas. Eu fazia mais por obrigação, porque, nessas brincadeiras de médico, o sujeito sempre age na base de tudo ao que tenho direito, parece que é uma espécie de ética da brincadeira. E depois eu não sabia mais o que fazer e ficava grandemente agoniado.

Você nesse dia quase vai, mas acabou não indo, porque quebrou a corrente da bicicleta e seu pai não deixou você sair, mas você se lembra que eu contei a Dodô a respeito de meu grande tédio nos exames ginecológicos e aí ele me explicou, com altos ares, que tudo aquilo acontecia porque minhas pacientes eram meninas. Que com gente grande era bastante diferente e, se eu tivesse oportunidade de ver uma verdadeira xoxota, madura, no ponto, eu ficaria deslumbrado, pois não havia homem neste mundo que não se tomasse de tremores, não sentisse as partes palpitarem e não se visse atraído como por um redemoinho para aquela maravilhosa gruta do prazer. Dodô falou "gruta do prazer", eu me lembro perfeitamente disto, você veja, pensando bem, como a nossa geração era mais culta, pela metáfora se conhece a cultura. Era domingo e nós fomos para uma casa grande na rua Duque de Caxias, onde os patrões não estavam porque tinham ido à Atalaia e estava a empregada que Dodô tinha acertado. Ele esclareceu que ela gostava de meninos assim de nossa idade. Ela disse que tem vontade de morder, falou ele. Eu não me esqueço disso, fiquei com vontade de pedir que ela não me mordesse e ao mesmo tempo tive vergonha. E não era pecado isso num domingo, não, heim, rapaz? Antes de chegar em casa, tinha de passar na igreja, lavar as mãos e a boca na água benta, que é para não pegar nem beijar na mãe assim, mãe é sagrada e os dedos caem e os beiços dão lepra e é inferno certo. Bem, se eu já estava nervoso, mais nervoso fiquei quando vi a mulher, porque ela nos levou para um quarto que parecia uma garagem e ficou fungando meu pescoço e passando a mão em mim. Dodô contou a história dos meus exames médicos. Ela aí deu risada e falou meu mediquinho, você é meu doutorzinho, quer fazer zamezinho na sua doentinha. Nessa hora ela rolou na cama, me puxando, mas as mãos dela escorregaram em minha nuca e eu fiquei sentado, de maneira que, quando ela caiu para trás, abriu as pernas e eu vi lá dentro. Lembro perfeitissimamente que era uma calçola meio marrom clarinho e eu não tive certeza de se era marrom claro ou branco encardido e bem no meio, garanto a você, havia uma mancha escura, como se estivesse molhado. Fiquei todo arrepiado, inclusive porque o meio das pernas dela e o jogo de sombras lá dentro me lembraram os desenhos do inferno, de uma edição da Divina Comédia que meu pai tinha. Eu pensei assim: e se, neste domingo, eu estiver indo para o inferno? Mas não disse nem fiz nada, fiquei ali na beira da cama, até que ela, depois de botar todos os balangandãs de Dodô, com tudo, na boca por um instante, se sacudiu para fora do vestido, como se estivesse explodindo. Eu vi Dodô nu, igual a um passarinho pelado, e logo depois só pude olhar a mulher, que ficou com os peitos enormes e de bicos pretos, bicos como lanças para fora balançando. Examine aqui, disse ela, e baixou as calçolas logo depois que desamarrou o cadarço. Você acredita que eu acho que tive febre naquela hora? E nisso está Dodô sem calça, no canto do quarto, tiritando, uma coisa esquisitíssima. Achei que notei uma espécie de língua no meio dos cabelos da mulher, na parte de baixo, e ela então caiu de costas na cama com as pernas abertas e — você sabe o que é um sujeito apavorado? Quer dizer, você tem alguma idéia de um cara em pânico? Quando eu vi aquilo, rapaz, e pareceu que subiu um cheiro, não tinha quem me fizesse chegar perto. Ela foi falando sobre o exame que eu tinha de fazer nela e eu fui ficando com medo, ficando com medo, que só me lembro ter descido correndo a Duque de Caxias, sem olhar para trás.

Acho que tive um certo trauma com isso. Até mesmo o consultório eu converti numa espécie de clínica veterinária, embora nunca tivéssemos tido um gato que concordasse tanto em ser capado e tomar lavagens quanto aquele. Por aí você pode ver como realmente os acontecimentos determinam as vocações. Sempre dizem que eu fui ser médico para satisfazer minha mãe, mas não é verdade, ela queria que eu fosse pediatra e acho tanto pediatras quanto geriatras uns anormais, uns cronoinvertidos. Não, não, se eu não fosse psiquiatra, eu seria proctologista. Mas não aqui em Aracaju.