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segunda-feira, abril 30, 2007

BREVE CONSIDERAÇÃO À MARGEM DO ANO ASSASSINO DE 1.973 Vinícius de Moraes. Poesia

BREVE CONSIDERAÇÃO À MARGEM DO ANO ASSASSINO DE 1.973
Vinícius de Moraes


Que ano mais sem critério
esse de 73
Levou para o cemitério
três Pablos de uma só vez
Três Pablões, não três pablinhos
No tempo como no espaço
Pablos de muitos caminhos:
Neruda, Casals, Picasso.

Três Pablos que se empenharam
contra o fascismo espanhol
Três Pablos que muito amaram
Três Pablos cheios de Sol.

Um trio de imensos Pablos
em gênio e demonstração
Feita de engenho, trabalho
Pincel, arco e escrita à mão.

Três publicíssimos Pablos:
Picasso, Casals, Neruda
Três Pablos de muita agenda
Três Pablos de muita ajuda.
Três líderes cuja morte
o mundo inteiro sentiu

Oh! ano triste e sem sorte
Vá prá puta que o pariu !

domingo, abril 29, 2007

A última ceia. Da Vinci.

O CÁLICE TRANSBORDA. Charles Fonseca. Poesia.

O CÁLICE TRANSBORDA
Charles Fonseca

Afastem de mim este cálice
Do estar distante odioso
Eu estou salvo idoso
Do desamor, afaste-se.

Tragam pra mim este cale-se
De só falar de amores
De só odiar rancores
Do só a vós amar, fale-se.

sábado, abril 28, 2007

O ferrolho (Jean Honoré Fragonard).

DELÍRIO
Olavo Bilac

Nua, mas para o amor não cabe o pejo
Na minha a sua boca eu comprimia.
E, em frêmitos carnais, ela dizia:
- Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!

Na inconsciência bruta do meu desejo
Fremente, a minha boca obedecia,
E os seus seios, tão rígidos mordia,
Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.

Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
- Mais abaixo, meu bem! - num frenesi.

No seu ventre pousei a minha boca,
- Mais abaixo, meu bem! - disse ela, louca,
Moralistas, perdoai! Obedeci...

sexta-feira, abril 27, 2007

A educação de Cupido. Correggio.

Desabotoando a alma.

“Tudo o que a pessoa faz com sua roupa, com freqüência sem se aperceber, é igualmente importante e merece a atenção do médico. Cada alteração nos trajes habituais, cada pequeno sinal de desleixo – como um botão desabotoado – cada indício de desnudamento tem a intenção de expressar algo que o portador da roupa não quer dizer diretamente e do qual, na maioria das vezes, nem está ciente. As interpretações desses pequenos atos casuais, bem como a comprovação delas, emergem a cada vez, com crescente certeza, das circunstâncias concomitantes durante a sessão, do tema nela tratado e das associações que ocorrem quando se chama a atenção para o ato aparentemente casual.” Freud.

quinta-feira, abril 26, 2007

A Maja vestida. Goya.

ILUSÃO
Fagundes Varela

Sinistro como um fúnebre segredo
Passa o vento do Norte murmurando
Nos densos pinheirais;
A noite é fria e triste; solitário
Atravesso a cavalo a selva escura
Entre sombras fatais.

À medida que avanço, os pensamentos
Borbulham-me no cérebro, ferventes,
Como as ondas do mar,
E me arrastam consigo, alucinado,
À casa da formosa criatura
De meu doido cismar.

Latem os cães; as portas se franqueiam
Rangendo sobre os quícios; os criados
Acordem pressurosos;
Subo ligeiro a longa escadaria,
Fazendo retinir minhas esporas
Sobre os degraus lustrosos.

No seu vasto salão iluminado,
Suavemente repousando o seio
Entre sedas e flores,
Toda de branco, engrinaldada a fronte,
Ela me espera, a linda soberana
De meus santos amores.

Corro a seus braços trêmulo, incendido
De febre e de paixão... A noite é negra,
Ruge o vento no mato;
Os pinheiros se inclinam, murmurando:
- Onde vai este pobre cavaleiro
Com seu sonho insensato?...

quarta-feira, abril 25, 2007

O esquecimento.

“Faço uma distinção entre o esquecimento de impressões e experiências, ou seja, de um saber, e o esquecimento de intenções, ou seja, da omissão de um fazer. Posso antecipar o resultado uniforme de toda a série de observações: na totalidade dos casos, o esquecimento mostra basear-se num motivo de desprazer.” Freud.

terça-feira, abril 24, 2007

Lady Godiva. John Collier. Pintura

CONVIDO-TE. Charles Fonseca. Poesia

CONVIDO-TE
Charles Fonseca

Convido-te, amiga, às doces paragens
Campestres, ao silêncio dos prados,
Aos ternos murmúrios dos nossos regatos,
Aos roucos sussurros aquém das miragens.

Convido-te comigo a outros olhares,
A outros dizeres dos nossos silêncios,
A outros perfumes a nós como prêmios,
Tocar nossas harpas, frementes, vibrares.

Convido-te, amiga, pra caminhada
A dois pela praia, o mar por fronteira,
As nossas dores escrever na areia,
Do nosso amor gozar, madrugada.

segunda-feira, abril 23, 2007

A consciência.

“A especulação psicanalítica toma como ponto de partida a impressão, derivada do exame dos processos inconscientes, de que a consciência pode ser, não o atributo mais universal dos processos mentais, mas apenas uma função especial deles.” Freud.

domingo, abril 22, 2007

Vênus olhando-se ao espelho. Diego Velazquez. Pintura

Chiste metonímico.

“Heine estava com o poeta Fréderic Soulié num salão quando este lhe disse, a propósito de um personagem coberto de ouro, figura que ocupava um bocado de espaço na época, como vocês podem ver, e que era muito requisitada: - Como vê, meu caro amigo, o culto ao bezerro de ouro não acabou. – Oh – respondeu, depois de olhar o personagem: - para um bezerro, ele me parece ter passado um pouco da idade. Freud citado por Lacan.

sábado, abril 21, 2007

Ciprestes. Van Gogh.

NO MEIO DO CAMINHO
Carlos Drummond de Andrade

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

sexta-feira, abril 20, 2007

Mona Lisa. Leonardo da Vinci.

TRADUZIR-SE
Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?

quinta-feira, abril 19, 2007

Abertura. Paul Cézanne.

A VIDA
Amadeu Amaral

Eis a Vida: seguir umas quimeras vagas,
lançando a mão em sangue aos cardos e aos espinhos
rolar no pó; gemer; deixar pelos caminhos
mil farrapos de carne e o sangue de mil chagas;

sorver o horrendo fel que anda em todos os vinhos,
o veneno que jaz em todas as teriagas;
persistir, todavia, entre as chufas e as pragas
dos que vão, a ulular, por trilhos convizinhos;

chegar, enfim, exausto, ao fastígio da idade,
ver desfeito o jardim de encanto que sonhamos,
cair desfalecido e - supremo revés -

olhando para trás, ver que a felicidade
ficou além, no vale, onde, espectros, passamos,
ficou além, na flor que calcamos aos pés...

quarta-feira, abril 18, 2007

Almoço em La Grenouillére (Pierre Auguste Renoir).

Psicanálise, O porque do divã. Freud.

“Insisto no conselho de deitar o paciente num divã, enquanto o analista toma lugar atrás dele, sem que o veja. Essa disposição tem um sentido histórico: é um resíduo do tratamento hipnótico, a partir do qual se desenvolveu a psicanálise. Mas ela merece ser conservada por diversas razões. Em primeiro lugar, por um motivo pessoal, que contudo outros compartilhem comigo. Não suporto ser fitado por outrem durante oito (ou mais) horas por dia. Como ao escutar abandono-me, eu mesmo, ao curso de meus pensamentos inconscientes, não quero que minha expressão dê ao paciente material para interpretações ou o influencie no que tem a dizer. Habitualmente, o paciente concebe a situação que lhe é imposta como uma privação e se opõe a ela, especialmente se a pulsão visual desempenha em sua neurose um papel significativo. Persisto, porém, nessa medida, que tem o propósito – e o atinge – de impedir a mistura imperceptível da transferência com as associações do paciente e de isolar a transferência, deixando-a aparecer a seu tempo como uma resistência nitidamente circunscrita.” Freud.

terça-feira, abril 17, 2007

INVULNERÁVEL. Cruz e Sousa. Poesia

INVULNERÁVEL
Cruz e Sousa

Quando dos carnavais da raça humana
Forem caindo as máscaras grotescas
E as atitudes mais funambulescas
Se desfizerem no feroz Nirvana;

Quando tudo ruir na febre insana,
Nas vertigens bizarras, pitorescas
De um mundo de emoções carnavalescas
Que ri da Fé profunda e soberana,

Vendo passar a lúgubre, funérea
Galeria sinistra da Miséria,
Com as máscaras do rosto descoladas,

Tu que és o deus, o deus invulnerável,
Resiste a tudo e fica formidável,
No Silêncio das noites estreladas!

segunda-feira, abril 16, 2007

Pintura egípcia

Bioética. País dos expostos..Aborto.

Livrar-se da criança, quer seja sob a forma do extermínio, do aborto tardio ou do abandono, significa suprimir o apelo que coloca um adulto frágil à injunção da paternidade. O convívio com a infância joga o adulto no cerne de sua própria história, a de ter sido filho, a de ter sido também pequeno um dia. Matar uma criança é também matar a própria condição infantil, o drama de ser também filho e o de depender de alguém para ser. Para estas mães que tratam seus filhos como dejetos, livrar-se daquele corpo á apagar a realização de uma demanda insuportável. Aquilo que elas abandonam não é um filho, é um corpo de criança que a subjetividade materna não pôde conter. Os pequenos delinqüentes exterminados também estão na condição de corpos, de cadáveres, que calam seus incômodos atos usurpatórios de algo que a sociedade não quer ou não consegue lhes dar. Quando morre uma criança é uma filiação que deixa de ser tentada.” Diana M.L. Corso.

domingo, abril 15, 2007

Sombrinha. Monet.

ACORDES ANTES QUE ACORDES. Charles Fonseca. Poesia

ACORDES ANTES QUE ACORDES
Charles Fonseca

Minha amada ainda dorme
Na alvorada que ainda é cinza.
Dorme, amada, tu que és tão linda!
Velo por ti, que ninguém te acorde.

Sonha, amada, os teus desejos,
Que chegam a ti por entre véus.
São teus, tu bem mereces os céus,
Aqui em terra dou-te meus beijos.

Ainda sonhas, pra ti é noite.
Acordas, logo já é de dia.
O nosso amor pela alva guia.
Fiel até o final, sou-te.

sábado, abril 14, 2007

Os sonhos confusos.

“Existe uma relação íntima e regular entre a natureza ininteligível e confusa dos sonhos e a dificuldade de comunicar os pensamentos que estão por trás deles.” Freud.

sexta-feira, abril 13, 2007

Cartaz. Toulouse-Lautrec.

A FONTE
Victor Hugo

Da espalda de um rochedo, gota a gota
límpida fonte sobre o mar caia,
Mas, ao vê-la tombar em seu regaço:
" O que queres de mim?" O mar dizia.

"Eu sou da tempestade o antro escuro;
"Onde termina o céu aí começo;
"Eu que nos braços toda a terra espreito,
"De ti, tão pobre e vil, de ti careço?...

No tom saudoso do quebrar das águas
Ao mar, serena, a fonte assim murmura:
"A ti, que és grande e forte, a pobre fonte
Vem dar-te o que não tens, dar-te a doçura!"

quinta-feira, abril 12, 2007

Hemiciclo.

Lesa-majestade. Freud.

“Penso, contudo, que o imperador romano estava errado ao mandar executar um de seus súditos por ter sonhado que estava assassinando o imperador. Ele deveria ter começado por tentar descobrir o que significava o sonho; é muito provável que seu sentido não fosse o que parecia ser. E, mesmo que um sonho com outro conteúdo tivesse por sentido esse ato de lesa-majestade, acaso não seria acertado ter em mente o dito de Platão, de que o homem virtuoso se contenta em sonhar com o que o homem perverso realmente faz?”. Freud.

quarta-feira, abril 11, 2007

A transfiguração. Rafael.

Leilão de Jardim. Cecília Meireles. Poesia

LEILÃO DE JARDIM
Cecília Meireles

Quem me compra um jardim com flores?
borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?
Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
Uma estátua da Primavera?
Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?
(Este é o meu leilão!)

terça-feira, abril 10, 2007

Rosas e jasmins. Renoir.

Disfarces.

“Sempre que as neuroses se valem de disfarces, estão percorrendo trilhas por onde passou toda a humanidade nas épocas mais remotas da civilização – trilhas de cuja continuada existência em nossos dias, sob o mais diáfano dos véus, encontram-se provas nos usos lingüísticos, nas superstições e nos costumes.” Freud.

segunda-feira, abril 09, 2007

Jacó e Raquel. Camões. Poesia

JACÓ E RAQUEL
Luis de Camões

Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por prémio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando se com vê la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assi negada a sua pastora,
como se a não tivera merecida;

começa de servir outros sete anos,
dizendo:-Mais servira, se não fora
para tão longo amor tão curta a vida.

domingo, abril 08, 2007

Mais luz.

“De Goethe pode dizer-se que, pela sua inspiração, a sua presença vivida, extraordinariamente impregnou e animou todo o pensamento freudiano. Freud confessou que foi a leitura dos poemas de Goethe que o lançou nos seus estudos médicos e ao mesmo tempo decidiu do seu destino, mas isso é dizer pouco relativamente à influência de Goethe na sua obra. É pois com uma frase de Goethe, a última, que eu exprimirei a chave e o impulso da experiência analítica, com estas palavras bem conhecidas que ele pronunciou antes de mergulhar, de olhos abertos, no buraco negro: - “Mehr licht” (mais luz)." Lacan.

sábado, abril 07, 2007

O complexo de Édipo.

“Édipo, filho de Laio, Rei de Tebas, e de Jocasta, foi enjeitado quando criança porque o oráculo advertira Laio de que a criança ainda por nascer seria o assassino de sue pai. A criança foi salva e cresceu como príncipe numa corte estrangeira, até que, em dúvida quanto à sua origem, também ele interrogou o oráculo e foi alertado para evitar sua cidade, já que estava predestinado a assassinar seu pai e receber sua mãe em casamento. Na estrada que o levava para longe do local que ele acreditava seu lar, encontrou-se com o Rei Laio e o matou numa súbita rixa. Em seguida dirigiu-se a Tebas e decifrou o enigma apresentado pela Esfinge que lhe barrara o caminho. Por gratidão, os tebanos fizeram-no rei e lhe deram a mãe de Jocasta em casamento. Ele reinou por muito tempo com paz e honra, e aquela que, sem que ele o soubesse, era sua mãe, deu-lhe dois filhos e duas filhas. Por fim, então irrompeu uma peste e os tebanos mais uma vez consultaram o oráculo. É nesse ponto que se inicia a tragédia de Sófocles. Os mensageiros trazem de volta a resposta de que a peste cessará quando o assassino de Laio tiver sido expulso do país.

Mas onde está ele agora? Onde se há de ler agora
O desbotado registro dessa culpa de outrora?


(...) Estarrecido ante o ato abominável que inadvertidamente perpetrara, Édipo cega a si próprio e abandona o lar. A predição do oráculo fora cumprida.

É destino de todos nós, talvez, dirigir nosso primeiro impulso sexual para nossa mãe, e nosso primeiro ódio e primeiro desejo assassino, para nosso pai.” Freud.

sexta-feira, abril 06, 2007

A triste partida. Patativa do Assaré. Poesia

A TRISTE PARTIDA
Patativa do Assaré

Meu Deus, meu Deus
Setembro passou
Outubro e Novembro
Já tamo em Dezembro
Meu Deus, que é de nós,
Meu Deus, meu Deus
Assim fala o pobre
Do seco Nordeste
Com medo da peste
Da fome feroz
Ai, ai, ai, ai
A treze do mês
Ele fez experiênça
Perdeu sua crença
Nas pedras de sal,
Meu Deus, meu Deus
Mas noutra esperança
Com gosto se agarra
Pensando na barra
Do alegre Natal
Ai, ai, ai, ai
Rompeu-se o Natal
Porém barra não veio
O sol bem vermeio
Nasceu muito além
Meu Deus, meu Deus
Na copa da mata
Buzina a cigarra
Ninguém vê a barra
Pois barra não tem
Ai, ai, ai, ai
Sem chuva na terra
Descamba Janeiro,
Depois fevereiro
E o mesmo verão
Meu Deus, meu Deus
Entonce o nortista
Pensando consigo
Diz: "isso é castigo
não chove mais não"
Ai, ai, ai, ai
Apela pra Março
Que é o mês preferido
Do santo querido
Sinhô São José
Meu Deus, meu Deus
Mas nada de chuva
Tá tudo sem jeito
Lhe foge do peito
O resto da fé
Ai, ai, ai, ai
Agora pensando
Ele segue outra tria
Chamando a famia
Começa a dizer
Meu Deus, meu Deus
Eu vendo meu burro
Meu jegue e o cavalo
Nóis vamo a São Paulo
Viver ou morrer
Ai, ai, ai, ai
Nóis vamo a São Paulo
Que a coisa tá feia
Por terras alheia
Nós vamos vagar
Meu Deus, meu Deus
Se o nosso destino
Não for tão mesquinho
Ai pro mesmo cantinho
Nós torna a voltar
Ai, ai, ai, ai
E vende seu burro
Jumento e o cavalo
Inté mesmo o galo
Venderam também
Meu Deus, meu Deus
Pois logo aparece
Feliz fazendeiro
Por pouco dinheiro
Lhe compra o que tem
Ai, ai, ai, ai
Em um caminhão
Ele joga a famia
Chegou o triste dia
Já vai viajar
Meu Deus, meu Deus
A seca terrívi
Que tudo devora
Ai,lhe bota pra fora
Da terra natal
Ai, ai, ai, ai
O carro já corre
No topo da serra
Oiando pra terra
Seu berço, seu lar
Meu Deus, meu Deus
Aquele nortista
Partido de pena
De longe acena
Adeus meu lugar
Ai, ai, ai, ai
No dia seguinte
Já tudo enfadado
E o carro embalado
Veloz a correr
Meu Deus, meu Deus
Tão triste, coitado
Falando saudoso
Com seu filho choroso
Iscrama a dizer
Ai, ai, ai, ai
De pena e saudade
Papai sei que morro
Meu pobre cachorro
Quem dá de comer?
Meu Deus, meu Deus
Já outro pergunta
Mãezinha, e meu gato?
Com fome, sem trato
Mimi vai morrer
Ai, ai, ai, ai
E a linda pequena
Tremendo de medo
"Mamãe, meus brinquedo
Meu pé de fulô?"
Meu Deus, meu Deus
Meu pé de roseira
Coitado, ele seca
E minha boneca
Também lá ficou
Ai, ai, ai, ai
E assim vão deixando
Com choro e gemido
Do berço querido
Céu lindo e azul
Meu Deus, meu Deus
O pai, pesaroso
Nos fio pensando
E o carro rodando
Na estrada do Sul
Ai, ai, ai, ai
Chegaram em São Paulo
Sem cobre quebrado
E o pobre acanhado
Percura um patrão
Meu Deus, meu Deus
Só vê cara estranha
De estranha gente
Tudo é diferente
Do caro torrão
Ai, ai, ai, ai
Trabaia dois ano,
Três ano e mais ano
E sempre nos prano
De um dia vortar
Meu Deus, meu Deus
Mas nunca ele pode
Só vive devendo
E assim vai sofrendo
É sofrer sem parar
Ai, ai, ai, ai
Se arguma notíça
Das banda do norte
Tem ele por sorte
O gosto de ouvir
Meu Deus, meu Deus
Lhe bate no peito
Saudade de móio
E as água nos óio
Começa a cair
Ai, ai, ai, ai
Do mundo afastado
Ali vive preso
Sofrendo desprezo
Devendo ao patrão
Meu Deus, meu Deus
O tempo rolando
Vai dia e vem dia
E aquela famia
Não vorta mais não
Ai, ai, ai, ai
Distante da terra
Tão seca mas boa
Exposto à garoa
A lama e o paú
Meu Deus, meu Deus
Faz pena o nortista
Tão forte, tão bravo
Viver como escravo
No Norte e no Sul
Ai, ai, ai, ai

quinta-feira, abril 05, 2007

A primeira bailarina. Edgard Degas.

Sonhos de alívio.

“Muitas pessoas, portanto, que amam seus irmãos e irmãs e se sentiriam desoladas se eles morressem, abrigam desejos maléficos contra eles em seu inconsciente, datando de épocas anteriores; e estes são passíveis de se realizarem nos sonhos.” Freud.

Madona com São Jeronimo. Correggio.

PROCISSÃO. Charles Fonseca. Poesia

PROCISSÃO
Charles Fonseca

Corre lento o São Francisco
Lambe as terras que assoreia
As margens nuas, areia,
Sem matas, ao sacrifício

Da morte anunciada
Agoniza ele então
O pouco que resta vão
Querer levar sobre escada

Em obra, qual Ramsés,
Tornar mais rico empreiteiro
Oh meu Deus, salve ligeiro,
Dobra o joelho aos teus pés

O povo bom do sertão
Crente então no São Francisco
Noutras eras era pisco
Salve o rio, pedem então

O bispo com seus irmãos
Os protestantes com causa
Espíritas, ateus na cauda,
Todos pedem em procissão.

terça-feira, abril 03, 2007

A esperança. Augusto dos Anjos. Poesia

A ESPERANÇA
Augusto dos Anjos

A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença.
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,
Sirva-te a crença de fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro - avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da morte a me bradar: descansa!

segunda-feira, abril 02, 2007

Sua magestade o bebê. Freud. Psicanálise

“Existe, pois, uma compulsão a atribuir à criança todas as perfeições... A criança terá uma vida melhor que a de seus pais, não será submetida às necessidades que estes sabem ser as dominantes na vida. Doença, morte, renúncias ao gozo, restrições à sua vontade perdem a validade em se tratando da criança, as leis da natureza assim como as da sociedade ficam suspensas diante dela, que volta a ser o centro e o âmago da criação. (...) A criança é quem vai realizar os sonhos de desejo que os pais não puderam concretizar, será um grande homem, um herói em lugar do pai, desposará um príncipe, recompensa tardia para a mãe. O ponto mais dificultoso do sistema narcísico, essa imortalidade do ego que a realidade ataca sistematicamente, encontrou um lugar seguro quando se refugiou na criança. O amor dos pais, tão comovente e, no fundo, tão infantil, nada mais é do que seu narcisismo que acaba de renascer.” Freud.

domingo, abril 01, 2007

O nascimento de Venus. Sandro Botticelli.

A retórica de Antonio Vieira.

“Pergunto: que quer dizer comunhão? O nome comunhão – communio – não é inventado por homens, senão imposto por Deus e tirado das Escrituras sagradas em muitos lugares do Testamento Novo. E que quer dizer communio? Quer dizer communis unio: união comum. Assim explicam sua etimologia todos os intérpretes. De maneira que dando Cristo nome à Comunhão, não lhe pôs o nome de união particular que temos com ele, senão união comum que causa entre nós.” Padre Antonio Vieira.